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domingo, 8 de abril de 2018

Sobre a necessidade de uma mente nova

Sobre a necessidade de uma mente nova

Convém termos desde já uma noção bem clara da finalidade destas reuniões. Não devem elas degenerar, de modo nenhum, em mera troca intelectual de palavras e ideias ou exposição de pontos de vista pessoais. Não estamos tratando de ideias, porquanto as ideias são unicamente a expressão de nosso próprio condicionamento, nossas próprias limitações. Discutir a respeito de ideias, sobre quem tem razão e quem não a tem, é coisa completamente fútil. Tratemos, antes, de explorar juntos os nossos problemas. Em vez de ficarmos inativos, como os assistentes de uma competição esportiva, tomemos parte ativa, cada um de nós, nestas discussões, para vermos se podemos penetrar profundamente os nossos problemas, não apenas os individuais, mas também os coletivos. Penso que há possibilidade de ultrapassarmos os murmúrios, as “ tagarelices” da mente, ultrapassarmos todas as exigências e influências mundanas e descobrirmos por nós mesmos o que é verdadeiro. E com esse descobrimento do verdadeiro estaremos aptos a enfrentar, a ficar com os numerosos problemas que atormentam cada um de nós.

Assim sendo, procuremos investigar inteligentemente, com calma e cautela, a fim de apreendermos o integral significado da vida, de nossa existência — sua finalidade. E creio que só teremos essa possibilidade se formos honestos com nós mesmos, e isso é bastante difícil. Em nossa investigação, devemos desnudar a nós mesmos e não a outrem, de modo que, com nossa própria inteligência, nosso próprio exato pensar, possamos penetrar até encontrarmos algo de real valia.

Quase todos nós sabemos, não apenas da leitura dos jornais, mas também de nossa própria experiência direta, que uma estupenda transformação se está processando no mundo. Não estou pensando na transformação consistente em passar de um estado para outro, porém na rapidez com que está ocorrendo a transformação, não apenas em nossa vida pessoal, mas também na vida coletiva, na vida nacional de todos os povos do mundo.

Em primeiro lugar, as máquinas estão fazendo maravilhas. Sob muitos aspectos, os cérebros ou computadores eletrônicos estão operando com muito mais exatidão e rapidez do que nós, entes humanos. E já se estão estudando meios de produzir máquinas que acionarão outras máquinas, sem nenhuma interferência do homem. Vai-se, assim, eliminando gradualmente o homem. Funcionam essas máquinas com base nos mesmos princípios da mente humana, do cérebro humano. Talvez chegue o tempo em que poderão compor música, escrever poemas, pintar quadros — assim como se ensinou o macaco a pintar figuras, etc. Observa-se uma extraordinária onda remodeladora, e o mundo nunca mais tornará a ser para nós o que antes foi. Penso que todos aqui estamos bem apercebidos disso. Mas nenhuma certeza tenho sobre se estamos apercebidos de nossa relação individual com todo esse “mecanismo”; pois consideramos o saber coisa imensamente importante. Adoramos o saber — mas as máquinas são capazes de muito mais vasto saber... Este é um aspecto do problema.

Em seguida, constata-se a existência de todos os tipos de comunismo, fascismo, etc. Observa-se pobreza descomunal, esmagadora, degradante, na Ásia, e entes humanos a buscarem um sistema para resolver este problema. Mas o problema permanece sem solução, por causa de nossos pontos de vista limitados, nacionalistas, e porque cada país, cada sistema quer dominar os demais.

Parece-me, por conseguinte, que para enfrentarmos todos esses problemas de um ponto de vista diferente, se torna necessária a revolução fundamental; não uma revolução comunista, socialista, americana ou chinesa: uma revolução interior, uma mente completamente renovada. Este, parece-me, é o problema que nos deve interessar — e não a bomba atômica, ou a viagem à lua, ou o dar meia-dúzia de voltas ao redor da Terra dentro de um foguete; o macaco já fez isso, e outras pessoas e mais outras o farão. Positivamente, para se enfrentar a vida como totalidade, com todos os seus incidentes e acidentes, necessita-se de uma mente de todo diferente; não da chamada mente religiosa, produto da crença organizada, oriental ou ocidental: esta só serve para perpetuar a divisão e criar cada vez mais superstição e temor. Todas as absurdas divisões e limitações — pertencer a este ou àquele grupo, ingressar nesta ou naquela sociedade, seguir determinada forma de crença ou determinado padrão de ação — nada disso poderá resolver nossos imensos problemas.

Acho que só teremos possibilidade de atender a esses problemas quando ingressarmos num estado que não seja mero produto da experiência, porquanto a experiência é sempre limitada, sempre colorida, sempre contida nos limites do tempo. Temos de averiguar por nós mesmos — não achais? — se é possível ultrapassarmos as fronteiras da mente, a barreira do tempo, e descobrirmos o imenso significado da morte — e isso significa, realmente, descobrir o que é viver. Para tanto, sem dúvida, é absolutamente necessária uma mente nova — não uma mentalidade inglesa, indiana, russa ou americana, porém uma mentalidade capaz de apreender o significado do todo, capaz de demolir o nacionalismo, os condicionamentos, os valores, e transcender as palavras que a escravizam.

Eis o que é, para mim, o verdadeiro problema, o verdadeiro desafio. Gostaria de investigar junto convosco, inteligentemente, precisamente, sem sentimentalismos e sem parábolas, descobrir se há meios ou se nenhum meio existe de adquirirmos uma mente nova. Existe caminho, método, sistema de disciplina capaz de conduzir-nos a ela? Ou todos os métodos, disciplinas, sistemas e ideias têm de ser abandonados, abolidos, para que a mente se possa tornar nova, jovem, “inocente”?

Como sabeis, na Índia, aquele velho país tão cheio de tradições e infelizmente tão populoso, tem havido numerosos instrutores que estabeleceram o que é certo e o que é errado, que método se deve seguir, como meditar, o que pensar e o que não pensar; e dessa maneira todos se veem agrilhoados, aprisionados em diferentes padrões de pensamento. E também aqui, no Ocidente, o mesmo “mecanismo” se observa. Não queremos transformar-nos. Todos, com mais ou menos tenacidade, estamos em busca da segurança, em tudo o que fazemos; segurança na família, nas relações, nas ideias. Queremos ter certeza, e esse desejo de certeza gera temor, e o temor cria “a culpa” e a ansiedade. Se nos examinamos interiormente, podemos ver quão intensamente tememos quase tudo e como está sempre presente a sombra da “culpa”. Na Índia, cingir uma tanga limpa faz uma pessoa sentir-se “culpada”; tomar uma refeição completa faz a pessoa sentir-se “culpada” — pois há tanta pobreza, tanta sordidez e miséria por toda a parte! Aqui a situação não é tão má, porque o Estado cuida do bem-estar social, e há trabalho e um alto grau de segurança; mas há outras formas de “culpa” e ansiedade. Sabemos de tudo isso, mas, infelizmente, não sabemos como libertar-nos de todos esses horríveis fatores limitativos; não sabemos como sacudi-los de nós completamente, para que nossa mente torne a ser nova, “inocente”, jovem. Por certo, só a mente que se renova pode perceber, observar, descobrir se existe uma realidade, se existe Deus, se existe algo além de todas as palavras, frases e condicionamentos.

Considerando, pois, tudo isso, que se deve fazer? E se há algo que cumpre fazer, que é esse algo e em que direção ele se encontra? Não sei se o que estou dizendo tem alguma significação para vós. Para mim, trata-se de coisa muito séria; “sério”, não no sentido de “fazer uma cara solene”, mas no sentido de sermos ardorosos, impetuosos, diretos. E se sentis também essa necessidade de uma mente nova, investiguemos onde começar e o que cumpre fazer.

Krishnamurti, Londres, 02 de maio de 1961, O Passo Decisivo

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

A libertação não ocorre pela mente consciente

Fundamentalmente, o nosso problema é o de operar uma revolução em nossa maneira de pensar, psicologicamente, basicamente. Tal transformação não pode ser efetuada por esforço consciente, porquanto, como disse, a mente consciente se constrói em torno da tradição, de experiências produzidas pela ação condicionada. Assim sendo, enquanto a mente está sempre a imaginar e a conceber planos, para agir de acordo com eles, sob coerção, mediante ajustamento e imitação, é incapaz de encontrar uma solução para todos os nossos problemas. Ensinaram-nos desde a infância a cultivar a memória. A memória é essencial, num determinado nível de nossa existência; entretanto, a memória não fornece a verdadeira solução de nenhum problema; ela é tão-somente capaz de traduzir o problema em conformidade com sua própria condição, sua própria experiência. Se, como hinduísta, experimentam uma coisa, vocês a traduzem de acordo com a mente condicionada de vocês; ou, se são comunistas, receberão a experiência ou a traduzirão segundo as definições do materialismo dialético ou coisa semelhante. Nessas condições, nunca recebem a experiência com a mente não-condicionada; e a mente condicionada, ao criar um padrão, uma norma de ação, cria mais problemas, maiores sofrimentos e desgraça. É isso que cumpre reconhecer. Acho muito importante perceber que o esforço interior, sob qualquer forma, é sempre imitativo; esforço significa imitação, ajustamento; e por meio do ajustamento não há possibilidade de transformação radical.[...] Mas, há possibilidade de libertação, no nível inconsciente, desde que eu seja capaz de ouvir sem traduzir nem interpretar a verdade relativa ao que me é dito. Podem averiguá-lo, experimentando-o em si mesmos. 

Senhores, não estamos numa reunião de discussão. Esta reunião não comporta discussões. 

Temos aqui um problema dificílimo; há séculos e séculos a mente está cultivando a memória, e ela é o único instrumento de que dispomos. E temos feito uso desse instrumento para resolver os nossos problemas. Endeusamos o intelecto (não entendam, todavia, que devemos nos tornar sentimentais, ou devotos, ou desordenados). É muito difícil perceber que os problemas não podem ter solução por intermédio da mente, por intermédio do "processo" do pensamento, uma vez que o pensamento é sempre condicionado. Não há liberdade de pensamento, visto que o pensamento, que é memória, que é o resultado de várias experiências passadas, é condicionado, limitado; e esse pensamento, quando aplicado a resolver os nossos problemas, só pode aumentá-los e acrescentar-lhes novos problemas. Posso perceber a verdade a respeito do pensamento condicionado e deixar que ocorra uma revolução no nível inconsciente? Porque, no nível inconsciente, não há limitação, não há ajustamento, uma vez que lá, a mente não interfere, buscando resultado; lá a mente não se esforça; não recalca, não procura tornar-se alguma coisa; lá, ela está apenas presente. A mente pode compreender o que é a Verdade. A Verdade não é o processo de análise, nem a simples observação de conhecimento. Mas a Verdade só pode ser compreendida no nível inconsciente, com a mente muito tranquila, não interferindo, não traduzindo. Se percebermos isso fundamentalmente, veremos que há, aí, uma transformação radical da nossa maneira de pensar. Entretanto, como disse, a mente foi exercitada para interferir, para buscar sempre, ativamente, um resultado. É só no nível inconsciente que se pode encontrar o Amor. E só o Amor é capaz de efetuar uma revolução. 

Jiddu Krishnamurti em, Autoconhecimento — Base da Sabedoria

A Verdade não se apresenta à mente superficial

Pergunta: Há muitos anos o ouvimos. Entretanto, continuamos abjetos, ignóbeis, rancorosos. Não raro nos sentimos como que abandonados por você. Sabemos que não nos quer para discípulos, mas há necessidade de se eximir completamente da vossa responsabilidade perante nós? Não deve nos dar a mão, nos guiar?

Krishnamurti: Senhores, eis uma maneira indireta de perguntar: "Por que você não quer ser nosso guru?" (Risos). Ora, Senhores, o problema nada tem a ver com abandoná-los ou dar-lhes a mão, porque, presume-se, somos pessoas adultas. Pelo menos fisicamente já somos adultos; mentalmente, somos crianças de catorze e quinze anos; e queremos um ente glorificado, um Salvador, um guru, um Mestre, que venha nos tirar de nossa desgraça, de nossa confusão; que nos explique o presente estado de caos; que "explique", e não que produza uma revolução em nosso pensar; e isso basta para nós. 

Fazem estar pergunta com o desejo de encontrar uma saída desta confusão; com o desejo de se libertarem do temor, do ódio, de toda mesquinhez da vida; e contam com a ajuda de alguém, a esse respeito. Ou talvez, outros gurus não conseguiram fazer com que adormecessem com uma dose de ópio, com uma explicação; por isso se voltam para outra pessoa, dizendo: "por favor, nos guie". É este o problema, para vocês — a substituição de um antigo guru por um novo, de um antigo mestre por um novo, de um antigo líder por um novo? Tenham a bondade de ouvir com toda a atenção. Pode alguém conduzi-los à Verdade, ao descobrimento da Verdade? É possível o descobrimento, quando somos levados à fazê-lo? Se forem conduzidos à Verdade, vocês a descobriram, vocês a experimentaram? Pode alguém — seja qual for essa pessoa — conduzi-los à Verdade? Quando dizem que precisam seguir alguém, não implica isso em que a Verdade é uma coisa estacionária, que a Verdade está em algum lugar, para serem conduzidos até lá, olhá-la, e levá-la? 

A Verdade é algo que tem de ser descoberto ou algo a que somos conduzidos? Se é algo a que somos conduzidos, então o problema se torna muito simples: tratarão de encontrar o guru ou guia que mais lhe agrade, e ele os levará onde a Verdade está. Mas, por certo, a Verdade que buscam se acha acima do plano das explicações; ela não é estática, tem de ser experimentada; tem de ser descoberta; e não pode ser experimentada por intermédio de um guia. Como posso experimentar espontaneamente uma coisa original, se me dizem "olhe aqui uma coisa original — experimente-a!" O ódio, a vileza, a ambição, a frivolidade, são os problemas de vocês, e não o descobrimento da Verdade. Não podem achar o que é a Verdade com uma mente frívola. Uma mente superficial, maledicente, estúpida, ambiciosa — jamais descobrirá o que é a Verdade. Uma mente frívola não pode criar senão uma coisa frívola; não pode criar senão um Deus frívolo. Nosso problema, por conseguinte, não é o de achar ou descobrir o que é Deus, mas o de percebermos como somos frívolos. 

Veja, Senhor, se sei que sou frívolo, que estou desgraçado, que sou infeliz, posso então fazer alguma coisa. Entretanto, se sou frívolo e digo "não devo ser frívolo, quer ser um homem superior", nesse caso estou fugindo, e isso é frivolidade. Compreenda isso, por favor.

O importante é descobrir-se e compreender-se o que é, e não, transformá-lo noutra coisa final. Afinal, uma mente estúpida, mesmo quando procura se tornar muito sagaz, muito penetrante e inteligente, continua estúpida do mesmo modo, porque sua essência mesma é a estupidez. Não gostamos de escutar. Queremos alguém que nos converta a frivolidade numa coisa superior e nunca aceitamos, jamais o que é, na sua realidade. O descobrimento do que é, da realidade, é importante; é a única coisa verdadeiramente importante. Em qualquer nível que seja — econômico, social, religioso, político, psicológico — o que mais deve interessar é o descobrimento do que é, no seu aspecto exato — e não o que deveria ser

Prestem atenção. Esta pergunta suscita várias questões. O interrogante deseja alguém, para ajudá-lo a se libertar das complicações de sua vida; está, portanto, à procura de um guia. O guia que ele busca é produto da sua confusão, da sua atribulada condição; e por isso o guia é também confuso. Senhor, não sabem o que ocorre pelo mundo? Um homem que se vê confuso, no meio de tanta agitação; aparece um líder político; o homem vota nele, por causa da confusão em que se acha; e criou, dessa maneira, um político também confuso, que se torna seu líder, seu guia. Assim também o guru, ou o mentor, ou o guia que escolhem; o escolhem por causa da confusão de vocês, por causa de seus desejos de satisfação e segurança; consequentemente, "projetam" o desejo de vocês, e o guru, portanto, é criação de vocês. Ele vai lhes dar satisfação e por isso aceitam o que ele oferece — o que denota que nunca enfrentam o que é, o que existe em si mesmos, o que realmente são. É só quando a mente de vocês não está fugindo, evitando o que é, perseguindo um ideal — quando a mente não diz "não deve ser assim", dever "ser assim", etc., é só então que se pode descobrir a maneira de agir com relação ao que é. Então, o problema será resolvido. Só resolverão o problema quando, na realidade, descobrirem o que é o "eu". Se sabem que são frívolos, que possuem uma mente superficial, que odeiam seus semelhantes; se percebem bem esse fato, sabem então agir com relação a ele. Podemos examinar a questão de como agir em relação ao fato. Se afirmam, porém, "não devo odiar, devo amar", nesse caso estão penetrando num mundo ideológico — o que representa a maneira mais estúpida de fugir ao que é

Esta pergunta denuncia a falta de interesse em compreender a verdade relativa aos nossos problemas. Só a Verdade pode nos libertar. A compreensão apenas pode vir quando não estamos seguindo alguém, quando não existe autoridade de espécie alguma — se a autoridade da tradição, seja a autoridade dos livros, do guru, da nossa própria existência. Nossa experiência é resultado de nosso condicionamento, e tal experiência não pode nos ajudar a descobrir o que é a Verdade.

Nessas condições, os que se sentem seriamente interessados, os que desejam de fato descobrir a Verdade relativa aos seus problemas, devem, naturalmente, colocar à margem, tudo quanto é autoridade. Isto é dificílimo, porque quase todos nós estamos cheios de temor. Precisamos de alguém para nos escorar, para nos dar coragem; precisamos do "irmão mais forte" — aquele que mora na Rússia, ou na Inglaterra, ou na América, ou do outro lado do Himalaia, ou "ali na esquina". Todos precisamos de alguém para nos ajudar. Enquanto estivermos encostados em alguém, nunca chegaremos a compreender o "processo" do nosso pensar; negaremos assim, a nós mesmos, o descobrimento da Verdade.

Escutem o que estou dizendo; não o rejeitem, pois ainda não resolveram o problema de vocês e ainda são tão infelizes como antes. Enquanto estiverem seguindo um guru ou seus líderes políticos, estarão confusos. Há uma única maneira de resolver este problema, que é pela compreensão de si mesmos, nas suas relações, de momento em momento, de dia em dia: os antagonismos, os ódios, as paixões, o amor efêmero etc. estão embaraçados no problema, e só o resolverão quando o aceitarem, quando o virem tal qual é. Só depois de o resolverem, terão a possibilidade de libertar do condicionamento a mente de vocês, deixando assim a Verdade reinar. 

Jiddu Krishnamurti em, Autoconhecimento — Base da Sabedoria

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

A arte de viver não se encontra em livros e em gurus

Uma mente tranquila é essencial para a percepção do todo; e a mente só está tranquila quando compreende cada pensamento e cada sentimento que surge. Isto é, a mente se torna tranquila quando cessa o processo de pensamento. Resistir, levantar uma muralha de isolamento e viver nesse isolamento, isso não é tranquilidade. A tranquilidade que é cultivada, disciplinada, forçada, a tranquilidade sob compulsão, é ilusória, e, em tais condições, a mente jamais perceberá o problema como um todo. 

O viver é uma arte, e a arte não se aprende num dia. A arte de viver não se encontra em livros, e nenhum guru a pode lhes dar; mas, visto que compram livros e seguem gurus, a mente de vocês está cheia de ideias falsas, cheias de disciplinas, de regras e restrições. Porque a mente de vocês nunca está tranquila, nunca está serena, é incapaz de perceber qualquer problema como um todo. Para se ver qualquer coisa plenamente, integralmente, necessita-se liberdade, e a liberdade não vem por meio de compulsão, de um processo de disciplina, de repressões, mas só quando a mente se compreende a si mesma, o que é autoconhecimento. 

Essa forma superior de inteligência que é o pensar negativo, só aparece quando cessou o processo do pensamento; e nessa vigilante tranquilidade, percebe-se o todo do problema. E só então há a "ação integrada", a ação plena, correta, completa. 

Krishnamurti em, A Arte da Libertação

domingo, 7 de setembro de 2014

Esfacelando a ilusão de que somos sérios

Quase todos nós, talvez, consciente ou inconscientemente, andamos em busca de segurança, nesta ou naquela forma: segurança nas posses, nas relações e nas ideias. E consideramos tais atividades muito sérias. Isso para mim, mais uma vez, não é seriedade. 

Para mim a palavra seriedade implica uma certa purificação da mente. Estou empregando a palavra "mente" num sentido geral, não específico, e mais adiante examinaremos o significado dessa palavra. Uma mente séria está sempre desperta, e, portanto, sempre se purificando, e nela não existe nenhuma busca de segurança. Ela não persegue uma certa fantasia, não pertence a nenhuma escola de pensamento, nenhuma religião, dogma, nacionalidade ou pátria; e não a preocupam, tampouco, os imediatos problemas da existência, embora seja necessário atender aos eventos de cada dia. A mente verdadeiramente séria tem de estar sobremodo vigilante, sumamente atenta, para que não tenha ilusões e não se deixe de envolver em experiências aparentemente proveitosas, convenientes e aprazíveis. 

Seria, pois, muito acertado se, exatamente no começo destas reuniões, ficasse bem claro para todos nós até que ponto e até que profundidade somos sérios. Com a mente alertada, inteligente e séria, penso que estaremos habilitados a considerar o inteiro padrão da existência humana em todo o mundo e, dessa compreensão total, chegarmos ao particular, ao indivíduo. Consideremos, pois, a totalidade do que está se passando no mundo, não simplesmente a título de informação ou de investigação de certo problema — problema atinente a um dado país, ou seita, ou sociedade, seja democrática, seja comunista ou liberal — mas, sim, consideremos o que realmente está ocorrendo no mundo. E daí, depois de percebermos o todo, de aprendermos o significado dos sucessos externos — não como conhecimento, não como opinião, porém percebendo os fatos, tais como estão realmente ocorrendo — daí chegaremos ao indivíduo. É isso que desejo fazer. 

(...) Considero essencial compreender o movimento exterior do mundo, a brutalidade, a crueldade, a tremenda ânsia de êxito, cada um desejando torna-se algo, aderir a certos grupos de ideias, de pensamentos e sentimentos. Se pudermos compreender todos os eventos exteriores, não em suas particularidades, porém aprendendo, a sua totalidade com um olhar livre de preconceito, livre de medo, não buscando segurança, não procurando refúgio em favoritas teorias, esperanças e fantasias, então o mundo interior terá significado totalmente diferente. Quando o movimento interior compreendeu o movimento exterior — é isso que chamo seriedade.

Krishnamurti em, O PASSO DECISIVO

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Pode a totalidade da mente tornar-se silenciosa?

(...) Para a maioria de nós, o pensar é de suma importância; mas é de fato? Ele tem sua importância, mas o pensamento não pode descobrir aquilo que não é produto do pensamento. O pensamento é resultado do "conhecido" e, por conseguinte, não pode sondar o "desconhecido", o incognoscível. O pensamento não é desejo, desejo que tem por objeto as necessidades materiais ou um elevado alvo espiritual? Não nos referimos ao pensamento do cientista, no seu laboratório, ou o pensamento do matemático, absorvido em seus cálculos, etc., porém ao pensamento conforme opera em nossa vida de cada dia, em nossos diários contatos e reações. Para subsistir, somos forçados a pensar. O pensar é o processo da subsistência de um indivíduo ou de uma nação. O pensar — que é desejo, sob o aspecto mais vulgar ou mais sublime — é sempre e necessariamente egocêntrico e um fator de condicionamento. Não importa se estamos pensando no Universo, em nosso próximo, em nós mesmos, ou em Deus — todo pensar é limitado, condicionado, não acha?(1)
(...) Temos acumulado conhecimentos a respeito de tantos aspectos da vida — medicina, guerra, leis, ciências — e temos pelo menos algum conhecimento de nós mesmos, de nossa consciência. Com tão vasto cabedal de conhecimentos, estamos livres do sofrimento, da guerra, do ódio? Se soubermos mais ainda, seremos libertados? Podemos saber que a guerra será inevitável enquanto o indivíduo, o grupo, o país for ambicioso, ávido de poder, e no entanto cada um de nós continua a seguir o caminho que conduz à guerra. Aquele centro onde se gera o antagonismo, o ódio, pode ser transformado radicalmente pelo conhecimento? O amor não é o oposto do ódio; se, pelo conhecimento, se transforma o ódio em amor, isso não é amor. Essa transformação produzida pelo pensamento, pela vontade, não é amor, porém, tão só, uma outra forma conveniente de autoproteção. (2)
(...) O pensamento é reação do pretérito, reação da memória, não é exato? A memória é tradição, experiência, e sua reação a qualquer experiência nova é produto do passado; nessas condições, a experiência está sempre a tornar mais forte o passado. A mente é o resultado do passado, do tempo; o pensamento é o produto de muitos dias passados. Quando o pensamento deseja transformar-se, tentando ser ou não ser isto ou aquilo, apenas perpetua a si mesmo, sob um nome diferente. Sendo produto do "conhecido", o pensamento nunca poderá experimentar "o desconhecido"; resultado do tempo, nunca compreenderá o atemporal, o Eterno. O pensamento deve cessar para que possa existir o Real.(3)
Veja senhor, temos tanto medo de perder aquilo que pensamos possuir, que nunca examinamos a fundo estas coisas. Só damos atenção à superfície de nós mesmos e vivemos a repetir palavras e frases de muito pouca significação; e, assim, continuamos medíocres e geramos antagonismos tão irrefletidamente como geramos filhos.(4)
Não há dúvida de que a mente está sempre a buscar algum resultado, algum meio de realizar algo. A mente é um instrumento que foi ajustado, parte por parte, ela é produto do tempo e só pode pensar em termos de resultado, de realização, de algo que se precisa ganhar ou evitar.(5)
(...) O próprio pensamento é o fabricante dessa rede; o pensamento só pode conduzir à amplidão do tempo, que é a esfera onde o saber, a ação, a virtude, têm muita importância. O raciocinar, por mais requintado ou por mais simples que seja, não pode quebrar o pensamento. A consciência como "experimentador", "observador", "selecionador", "censor", "vontade", tem de extinguir-se, voluntariamente, de maneira feliz, sem esperança alguma de recompensa. Deixa então de existir a entidade que busca. Isso é meditação. A realidade não pode ser procurada; ela existe quando aquele que busca não existe. A mente é tempo, e o pensamento não pode descobrir o imensurável.(6)
(...) Quando a mente está toda ocupada com suas penas, esperanças e temores, não lhe sobra espaço para a liberdade. O processo egocêntrico do pensamento só serve para tolhê-la mais ainda; e assim começa a funcionar o círculo vicioso. A preocupação desvaloriza, amesquinha, superficializa a mente. Uma mente preocupada não é uma mente livre, e a preocupação a respeito da liberdade gera, do mesmo modo, mediocridade. A mente permanece medíocre, quer esteja preocupada com Deus, o estado, a virtude ou o próprio corpo. Essa preocupação com o corpo impede a adaptabilidade ao presente, impede-lhe de adquirir vitalidade e mobilidade, mesmo em grau limitado. O "eu", com suas preocupações, atrai sobre si mesmo penas e problemas, que também atingem o corpo; e a apreensão relativa aos males físicos opera, mais ainda, em detrimento do corpo. Não significa isso que se deva ser negligente com a saúde, mas a preocupação com a saúde, tal como a preocupação com a Verdade, com idéias, só serve para proteger a mediocridade da mente. Há uma vasta diferença entre a mente preocupada e a mente ativa. A mente ativa está em silêncio, vigilante, sem fazer escolha.(7)
(...) O silêncio deve ser diligentemente cultivado, nutrido, fortalecido? E quem é o "cultivador"? Ele é diferente da totalidade do nosso ser? Existe silêncio, uma mente tranquila, quando um desejo domina todos os demais ou levanta defesas contra eles? Há silêncio quando se disciplina, molda e controla a mente? Não subentende tudo isso a existência de um censor, um pretenso "eu superior", que controla, julga, escolhe? Mas existe tal entidade? Se existe, não é produto do pensamento? O pensamento que se divide em "superior" e "inferior", "entidade permanente" e "entidade impermanente", é, obstante, produto do passado, da tradição, do tempo. Nesta divisão ele acha a sua própria segurança. Agora, o pensamento, buscando a segurança no silêncio, postula um método ou sistema que lhe ofereça o que deseja. Em lugar das coisas mundanas, aspira agora ao prazer do silêncio, fazendo, assim, nascer o conflito entre o que é e o que deveria ser. Não há silêncio, onde há conflito, repressão, resistência... Não haverá silêncio, se existe uma entidade a buscá-lo. Só se realizará o silêncio da mente tranquila, quando não existir mais "o que busca", quando não existir mais o desejo. Sem responder, faça esta pergunta a si mesmo: Pode a totalidade de nosso ser tornar-se silenciosa? Pode a totalidade da mente — a mente consciente e bem assim a inconsciente — tornar-se tranquila?(8)
(...) Não é curioso como a mente engana a si mesma? A mente não gosta de ser perturbada, não gosta de ser arrancada de seus velhos padrões, seus confortáveis hábitos de pensamento e de ação; ao ver-se perturbada, procura meios e modos de estabelecer novas delimitações, novas "pastagens", onde possa viver em segurança. É essa zona de segurança que quase todos andamos buscando, e o desejo de proteção, segurança, nos faz dormir. Circunstâncias, uma palavra, um gesto, uma experiência, poderão acordar-nos, perturbar-nos, contudo desejamos voltar a dormir novamente. Isso está acontecendo a todas as horas, à maioria de nós e não é um estado desperto. O que precisamos compreender são as maneiras em que a mente se põe a dormir, não acha?(9)
(...) Se cuidarmos apenas de conhecer as maneiras como a mente se põe a dormir, iremos de novo encontrar um meio, talvez diferente, de vivermos sem perturbações, em segurança. O importante é "ficar desperto" e não perguntar como ficar desperto; o desejo de como é desejo de segurança.
"Que se pode fazer então?"
Ficar com o descontentamento, sem o desejo de apaziguá-lo. O desejo de não ser perturbado é o que deve ser compreendido. Esse desejo, que assume várias formas, é o impulso a fugir de o que é. Desaparecendo esse impulso — não em virtude de compulsão, sob qualquer forma, consciente ou inconsciente — só então desaparece a dor do descontentamento. A comparação de o que é com o que deveria ser, causa dor. O cessar da comparação não é um estado de contentamento; é um estado de vigilância, livre das atividades do "eu".(10)
(...) "Mas como esvaziar a mente de seu saber?"
Não há nenhum "como". A prática de qualquer método só pode tornar a mente mais condicionada ainda, porque, com ele, temos um resultado e não uma mente livre do saber, do "eu". Não se necessita de método, porém, apenas, de um percebimento passivo da verdade relativa do saber.(11)
(...) O reconhecimento é o "processo do conhecido", produto do passado. A mente tem medo daquilo com que não está familiarizada... O que se experimenta se torna "o conhecido", o passado, e é desse passado, desse conhecido, que provém o reconhecimento. Enquanto houver esse movimento, vindo do passado, não existirá "o novo".(12)
(...) O pensamento é produto do tempo; o pensamento está ancorado no passado, não pode em tempo algum existir livre do passado. Se o pensamento se liberta do passado, deixa de ser pensamento. Especular sobre o que existe além da esfera da mente é de todo em vão. Para intervenção dAquilo que se acha além do pensamento, é necessário que o pensamento — o "eu" — deixe de existir. A mente deve estar, de todo, imóvel, tranquila — com a tranquilidade da ausência de "motivo". A mente não pode atraí-lo a si. A mente pode dividir, e de fato divide, a sua esfera de atividades, classificando-as em nobres e ignóbeis, desejáveis e indesejáveis, superiores e inferiores, mas todas estas divisões e subdivisões estão dentro dos limites da própria mente; e, assim, todo movimento da mente, em qualquer direção que seja, é reação do passado, e aquele que não a percebe permanecerá na sua escuridão, não importa o que faça; suas penitências e votos e disciplinas e sacrifícios poderão ter uma significação sociológica, confortante, mas nenhum valor tem, com relação à Verdade.(13)
A mente é semelhante a uma máquina a funcionar noite e dia, está sempre a "tagarelar" e sempre ocupada — acordada ou dormindo. Ela é veloz e inquieta como o mar. Uma outra parte dessa intrincada e complexa máquina procura controlar o seu movimento e, desse modo, começa o conflito entre os desejos e ânsias opostas. Uma parte pode ser chamada "eu superior" e a outra "eu inferior", mas todas as duas se acham na esfera da mente. A ação e reação da mente, do pensamento, são quase simultâneas e quase automáticas. Todo esse processo — consciente e inconsciente, de aceitação e rejeição, de sujeição e luta para ser livre, é extremamente rápido. A questão, pois, não é de como controlar esse complexo mecanismo, já que todo controle produz atrito e dissipação de energia; a questão é de saber se essa mente, que se move tão acelerada, pode diminuir a sua velocidade.(14) Reflexões sobre a vida, pág. 252
(...) Nunca notou, senhor, que quando estamos a observar uma coisa, a mente se torna mais lenta? Ao observar aquele carro que lá vai, pela estrada, ou ao olhar atentamente para qualquer objeto físico, a sua mente não está funcionando mais devagar? A vigilância, a observação torna, de fato, a mente mais vagarosa. O contemplar um retrato, uma imagem, um objeto, serve para aquietar a mente, o que também se consegue com a repetição de uma frase; mas, nesse caso, o objeto ou a frase se torna muito importante, mais importante do que a diminuição da velocidade da mente e o que é possível descobrir então... Prestamos deveras atenção a alguma coisa, ou interpomos entre o observador e a coisa observada uma cortina de preconceitos, valores, juízos, comparações, condenações?... Se me permite sugerir, não se deixe embargar por palavras ou por conclusões positiva ou negativa. Pode haver observação sem essa cortina? Por outras palavras, pode haver atenção quando a mente está ocupada? Só a mente desocupada pode prestar atenção. A mente se torna lenta, alertada, quando há vigilância, que é a atenção da mente desocupada.(15)
(...) A mente é o resultado de muitos milhares de anos de tradição e experiência. É capaz de invenções fantásticas, desde as mais simples às mais complexas. É capaz de extraordinárias alucinações, e vastas percepções. As experiências e esperanças, as ânsias, as alegrias e os conhecimentos acumulados, tanto do grupo como do indivíduo, tudo está lá, depositado nas camadas mais profundas da consciência, e é possível ressuscitar as experiências, visões, etc., herdadas e adquiridas. Dizem que certas drogas podem produzir uma lucidez, uma visão de grandes profundidades e alturas, libertar a mente de suas agitações, conferindo-lhe grande energia e acuidade. Mas é necessário a mente atravessar esses ocultos e sombrios corredores para alcançar a luz? E quando por qualquer desses meios ela encontra luz, é a luz do Eterno? Ou é a luz do "conhecido", da coisa reconhecida, produto da busca, da luta, da esperança? É necessário passar por esse fastidioso "processo" para se achar o imensurável? Pode-se deixar de lado tudo isso e chegar àquilo que se pode chamar amor?(16)
(...) É necessário passar por todas essas experiências? São elas necessárias para abrir a porta do Eterno? Não podem ser deixadas de lado? O essencial, afinal de contas, é o autoconhecimento, que faz nascer a mente tranquila. A mente tranquila não é produto da vontade, da disciplina, das várias praticas destinadas a subjugar o desejo. Todas essas práticas e disciplinas só tem o efeito de fortalecer o "eu", e a virtude se torna então um outro rochedo, sobre o qual o "eu" pode edificar a sua morada de importância e respeitabilidade. A mente precisa estar vazia do "conhecido", para que se torne existente o incognoscível. Se não se compreende as atividades do "eu", a virtude começa por vestir a capa da importância. O movimento do "eu", com sua vontade e desejo, suas buscas e acumulações, tem de cessar inteiramente. Só então se tornará existente o atemporal. O atemporal não pode ser chamado ou atraído. A mente que procura atrair o Real por meio de várias práticas e disciplinas, por meio de preces e atitudes, só pode receber suas próprias e agradáveis "projeções", que não são o Real.
"Percebo agora, depois de tantos anos de asceticismo, disciplina e automortificação, que minha mente está cativa na prisão que ela própria construiu, e que as paredes dessa prisão precisam ser demolidas. Como por mãos à obra?"
O próprio percebimento de que elas precisam desaparecer é suficiente. Toda ação, visando demoli-las, põe em movimento o desejo de realização, ganho, fazendo, portanto, nascer o conflito dos opostos, o "experimentador" e a "experiência", a entidade que busca e a coisa buscada. Perceber o falso como falso é, em si, suficiente, porquanto esse próprio percebimento liberta a mente do falso.(17)
(...) A mente está cativa na prisão que ela própria construiu, a prisão de seus desejos e esforços, e todo movimento dela, em qualquer direção, se faz dentro dos limites da prisão; mas, não estando cônscia disso, a mente, no seu sofrer e no seu conflito, busca um agente exterior que possa libertá-la. Em geral, acha o que procura, mas esse achado é produto de seu próprio movimento. Ela continua cativa, cm a só diferença de ser uma prisão nova — o que lhe é mais satisfatório e confortante.(18)
(...) Se a mente perceber a verdade disso, não à força de argumentação, convicção ou crença, mas pelo ser simples e atenta, tem então fim o pensamento. O findar do pensamento não é sono, abatimento da vitalidade, estado de negação; é um estado de todo diferente.(19)

(1) Reflexões sobre a vida, pág. 206
(2) Reflexões sobre a vida, pág. 207
(3) Reflexões sobre a vida, pág. 207
(4) Reflexões sobre a vida, pág. 207
(5) Reflexões sobre a vida, pág. 184
(6) Reflexões sobre a vida, pág. 184
(7) Reflexões sobre a vida, pág. 216
(8) Reflexões sobre a vida, pág. 216-217
(9) Reflexões sobre a vida, pág. 220
(10) Reflexões sobre a vida, pág. 220-221
(11) Reflexões sobre a vida, pág. 228
(12) Reflexões sobre a vida, pág. 236
(13) Reflexões sobre a vida, pág. 237-238
(14) Reflexões sobre a vida, pág. 252
(15) Reflexões sobre a ida, pág. 253
(16) Reflexões sobre a vida, pág. 259-260
(17) Reflexões sobre a vida, pág. 260-261
(18) Reflexões sobre a vida, pág. 242
(19) Reflexões sobre a vida, pág. 243

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Examinando a questão do conflito.


Áudio da reunião de estudo deste tema, pelo Paltalk, na noite de 11/08/2012

Para compreender o conflito, vocês precisam observar a si mesmos. E a observação exige desvelo. Desvelo significa compreensão, afeição: como quando se cuida de uma criança, em que não há repúdio ou condenação. Cuidar de uma criança é observá-la, sem condená-la, sem compará-la. Observá-la com infinita afeição, imensa compreensão; estudá-la em todos os seus movimentos, em todas as fases de seu desenvolvimento, em suas travessuras, suas lágrimas, seus risos. O observar, pois, exige desvelo. Esse é o primeiro requisito da auto-observação.; por conseguinte, nunca deve haver um momento de condenação, de justificação, de comparação, porém, sempre a observação pura e simples de tudo o que está ocorrendo, a cada momento do dia, quer a pessoa se ache no escritório, ou viajando num ônibus, ou conversando com alguém, etc. Cada um deve observar a si próprio tão completamente, com tão infinito desvelo, que daí resulte a precisão, uma precisão absoluta, e não apenas idéias vagas, ação ineficaz.
Como disse, para observarem a si mesmos, exige-se atenção completa. Uma mente que está atenta, cônscia de si própria no justo momento em que está a observar-se, está aprendendo a respeito de si mesma. Aprender é coisa toda diferente de acumular conhecimentos. Da infância até à morte, estamos sempre registrando; nossa mente se tornou uma espécie de fita de gravação, na qual tudo se vai registrando. De acordo com tal registro, nós atuamos, pensamos, reagimos; e a esse registro vamos acrescentando coisas e mais coisas, todos os dias, consciente ou inconscientemente. Guardamos toda experiência, toda informação, todo incidente, toda lembrança. E a isto chamamos experimentar, aprender. Mas isto, em absoluto, não é aprender; aprender é coisa totalmente diferente. No momento em que se começa a acumular, deixa-se de aprender. Pois só a mente que está fresca, que é nova, só a mente que observa com atenção, aprende.
Penso que devemos perceber a diferença entre estas duas coisas. O conhecimento técnico é acumulativo. A ele vai-se acrescentando mais e mais, e é com base nesse conhecimento que atuamos. Se são engenheiro, se são físico, tratam de acumular a maior soma possível de conhecimentos para trabalhar com base nesse conhecimento acumulado. E, por essa razão, nunca há liberdade. É sempre um agir com base no que se aprendeu, consoante o que se adquiriu. No nível do conhecimento técnico, tal ação, tal memória, tal processo acumulativo é absolutamente necessário. Mas nós estamos falando de coisa inteiramente diferente, ou seja que o observar com atenção não implica processo aditivo. Porque, se ficamos meramente adicionando, adquirindo, então, no minuto seguinte de nossa observação, observamos com base no que temos acumulado e, por conseguinte, já não estamos observando. Compreendam isso, por favor.
É importantíssimo compreender que, quando a mente está sempre acumulando, acrescentando algo a si própria e de tal base observando, então, tudo o que ela observa recebe o colorido do que antes foi aprendido, do conhecimento prévio. Essa mente, por conseguinte, é incapaz de compreender um fato novo. E a vida é sempre nova; o viver é algo totalmente novo, a cada minuto do dia. Mas, perdemos o frescor, esse extraordinário sentimento de vitalidade, de beleza, de imensidão, porque vamos sempre ao encontro da vida com nosso conhecimento acumulado e, consequentemente, nunca estamos aprendendo, porém, apenas adicionando mais alguma coisa às já existentes; com base nesse adicionamento, observamos as coisas, na esperança de aprender.
Assim, a mente que é séria, que está bem consciente da situação mundial, percebe que o mundo se acha num estado de angustiosa confusão. Nota-se um constante declínio em todas as nações; só uns poucos são capazes de funcionar inteligentemente, em liberdade talvez; os demais se limitam a imitar — são pobres imitações dos computadores, sua ação é ineficaz. A dor, a angústia, a ansiedade, o desespero é que são fatos, e não as crenças de vocês, suas esperanças, seus deuses; o fato do desespero, da ansiedade, da extraordinária persistência do sofrimento, sofrimento sem fim; a crescente animosidade e brutalidade — eis o mundo a que pertencem. A função da mente verdadeiramente séria é compreender a transcender esse mundo. A mente séria deve observá-lo. Isto é, vocês devem observar a si mesmos, porque vocês são o mundo; porque há em vocês angústia, sofrimento, solidão, desespero, ansiedade, medo, porque são impelidos pela ambição, a avidez, a inveja — vocês são esse mundo. Vocês não são o que pensam ser — que são Deus, etc. Isto é só absurda especulação. Vocês tem que partir dos fatos e tem de aprender a respeito de si mesmos.
Há, pois, diferença entre aprender e acumular conhecimento. O aprender é infinito, não há fim no aprender a respeito de si mesmo. E, por conseguinte, a mente que não está acumulando, porém aprendendo, é capaz de observar seus conflitos, suas tensões, suas dores e secretos desejos e temores. Se assim vocês fizeres, não acidentalmente, porém todos os dias, todos os minutos — e isso é possível — se vocês se mantiverem em constante observação, verão que adquirirão uma energia extraordinária. Porque então a autocontradição estará sendo compreendida.
Com a palavra "compreender" não me refiro a algo intelectual. A mente que está fragmentada nunca compreenderá nada. Quando digo que "compreendo uma certa coisa intelectualmente", o que realmente estou dizendo é que ouço a palavra e compreendo a palavra; isso nada tem a ver com a compreensão. Compreensão implica não só o aspecto semântico, isto é, o sentido da palavra, mas também a apreensão do inteiro conteúdo dessa palavra e de seu significado conforme se aplica a nós mesmos. A compreensão, pois, não é uma simples questão de "cerebração", mera atividade intelectual. Vocês só podem compreender alguma coisa, quando lhe aplicam a mente, o corpo, os sentidos, os olhos, os ouvidos, tudo. E dessa compreensão resulta a ação total, e não ação fragmentária, contraditória.
Nessas contradições, o que interessa — principalmente àqueles que são verdadeiramente sérios — é compreender. E a vida exige seriedade, pois não se pode viver neste mundo levianamente. Vocês não podem estar interessados apenas em suas próprias aflições, seus próprios divertimentos, seus próprios temores. Vocês são uma parte do mundo e devem compreender a si mesmos e isto constitui imensa tarefa. E quando são sérios, devem levar essa compreensão ao extremo, até perceberem tudo o que a existência implica.
E, também, o conflito é algo que temos de compreender — compreender, e não dominar. Não tentem negá-lo, não tentem fugir dele, porém, tratem de compreende-lo, de ver todo o seu significado, de perceber as várias contradições, na palavra, no pensamento, na ação. Em geral, vivemos vidas duplas, ou triplas, ou múltiplas! Funcionamos fragmentariamente, nosso existir é fragmentário; desejamos ser mundanos; desejamos ter todos os confortos que nos são devidos. O conforto, obviamente é necessário; mas, com esse conforto vem a exigência de segurança. Não só desejamos estar seguros em nossos empregos — reação natural e são — mas também desejamos estar seguros psicologicamente, interiormente.
É possível estar-se em segurança psicologicamente, em algum tempo — isto é, estarmos psicologicamente seguros em nossas relações e psicologicamente seguros em relação àquilo com que estamos identificados? A segurança exterior é evidentemente necessária. Exteriormente, é absolutamente necessário termos moradia, um lar, emprego; mas não nos contentamos com isso. Queremos estar em segurança interiormente, e nasce assim a ilusão. A partir desse momento, começa a desenrolar-se uma série de conflitos, de conflitos intermináveis.
Cumpre-nos, pois, descobrir a verdade em relação a essa formidável questão da segurança psicológica — sem procuramos saber o que outro qualquer diz. Psicologicamente, vemo-nos inseguros; por essa razão criamos deuses, deuses que se tornam nossa segurança permanente! Isso gera conflitos. Compreendem o que entendemos por "conflito"? Entendemos: a contradição; a ação fragmentária; os pensamentos que se chocam; os desejos conflitantes entre si; as exigências contraditórias; as pressões do mundo e a exigência interior de viver em paz com o mundo; a aspiração a encontrar algo além da existência diária, monótona, estúpida; o ver-nos presos na engrenagem da existência diária e desesperadora; o nunca termos uma solução para o nosso desespero; a angústia imensa, não apenas pessoal, mas também a angústia do mundo, e nunca encontrarmos uma saída dessa angústia. Eis todos os fatores que geram a contradição — dos quais podemos estar conscientes ou não. Onde a mente se acha em contradição, tem de haver conflito.
E, muito evidentemente, a mente que se acha em conflito não pode ir adiante; poderá prosseguir na ilusão, mas não é capaz de avançar para descobrir se algo existe além do tempo, além da medida humana. Sem dúvida, esta é a função da religião. A função da mente religiosa é descobrir o verdadeiro. E a verdade não pode ser encontrada num templo ou num livro, por mais venerado que ele seja. Vocês têm de descobrir por seus próprios meios. Não podem comprá-la com lágrimas, com orações, com repetições, com rituais; por esse caminho se vai ao absurdo, à ilusão, à insanidade.
A mente séria, por conseguinte, deve estar cônscia desse conflito. Com "estar cônscio" quero dizer, observar, escutar. Escutar é uma arte. Com efeito, é uma arte extraordinária o escutar um som. Não sei se vocês já escutaram um som — o som de um pássaro pousado numa árvore, ou o distante buzinar de um carro. Pelo escutar — não pelo julgar, pelo identificar tal som com determinada ave ou determinado carro ou determinado rádio da casa mais próxima, porém, pelo simples escutar, verão — se assim souberem escutar — como se tornarão extraordinariamente sensíveis. A mente se torna sobremodo alerta quando escutamos simplesmente — isto é, não interpretando o que ouvimos, não tentando traduzi-lo, não o identificando com o que já conhecemos — pois isso nos impede de escutar. Mas, se escutarem simplesmente — escutarem seus pensamentos, suas exigências, o desespero de suas existências, não tentando interpretar, traduzir nada, não tentando fazer alguma coisa em relação ao que se escuta — verão que a mente de vocês se tornará sobremodo lúcida.
E só a mente lúcida, a mente sã, racional, lógica, em que não há conflito, consciente ou inconsciente — só essa mente pode prosseguir até descobrir, por si própria, se existe uma Realidade. Só essa mente é religiosa. E só essa mente pode resolver os problemas do mundo. Os problemas do mundo são inumeráveis e estão se multiplicando. E se vocês não forem capazes de resolvê-los lógica, equilibrada, sadiamente, com o espírito de vocês de todo livre de conflito, estarão apenas criando mais confusão, mais angústias para o mundo e para vocês mesmos.
A primeira coisa, por conseguinte, que nos cumpre fazer é observar com atenção, todas as murmurações, todos os temores, ilusões, desesperos do próprio ser de vocês. E verão então, por si mesmos — e para isso vocês não necessitam de provas, nem de gurus, nem de livros sagrados — se a Realidade existe. E encontrarão aí, um extraordinário sentimento de libertação do sofrimento. Aí existe a claridade, a beleza e aquela coisa que está faltando hoje à mente humana: o amor, a afeição.
Madrasta, 12 de janeiro de 1964

Só pela seriedade é possível o conhecimento da natureza real que somos

Parece-me que o que se faz necessário é uma revolução total na consciência. E não será possível tal revolução, se permanecermos insensatamente apegados a crenças, idéias e conceitos. Não encontraremos saída de nossa confusão, angústia, conflito, pela constante repetição do Gita, do Upanishad e demais livros sagrados; isso poderá levar à hipocrisia, a uma vida de insinceridade, de interminável pregação moral, porém, nunca a enfrentar realidades. O que nos cumpre fazer é, segundo me parece, tornar-nos cônscios das condições de nossa existência diária, de nossos infortúnios, nossas angústias, nossa confusão e conflito, e tratar de compreende-los tão profundamente que possamos lançar uma base adequada, para começar. Não há outra solução. Temos de enfrentar-nos assim como somos e não como deveríamos ser segundo um certo padrão ou ideal. Temos de ver realmente o que somos e, daí, iniciar a transformação radical.
Dirão vocês: "Que feito ou valor pode ter uma transformação individual? Como poderá isso alterar o curso da existência humana? Que pode um só indivíduo fazer?" — Esta me parece uma pergunta errônea, porque não existe tal coisa — consciência individual; só há consciência, da qual somos uma parte. Um indivíduo pode segregar-se, cercar-se dentro de um determinado espaço chamado "eu". Mas esse Eu está relacionado com o todo, esse Eu, não é separado. E, com a transformação dessa seção especial, dessa determinada parte, podemos influir na totalidade da consciência. Considero muito importante compreender que não estamos falando de salvação individual ou reforma individual, porém, sim, da necessidade de estarmos conscientes da parte em relação com o todo. Desse percebimento nascerá uma ação que atingirá o todo. (...) Devemos descobrir, sem dúvida, uma fonte diferente, uma diferente maneira de vida que não esteja em contradição com o nosso viver de cada dia, e ao mesmo tempo, promover uma profunda compreensão religiosa da vida.
Para mim, o importante não é apenas a imediata "resposta" aos diferentes "desafios" — resposta que deve ser adequada — mas também resposta que seja produto de uma vida profundamente religiosa. Entendo por "vida religiosa", não uma vida ritualista, de ajustamento a determinado padrão, porém, a vida religiosa resultante da compreensão. Porque, sem o conhecimento de nós mesmos — o que realmente somos — por mais desonestos, falsos, astutos, hipócritas e ignóbeis que sejamos, não temos base para nenhuma ação ou pensamento religioso.
(...) Se não há autoconhecimento, se não há compreensão do Eu — não do "Eu superior", do Eu com "E" maiúsculo — porém do "eu" ordinário, do homem que frequenta diariamente o escritório, que é apaixonado, irascível, violento, cruel, hipócrita, acomodado — se não há essa compreensão total, completa, de todo nosso ser, nesse caso, toda ação, todo pensamento, toda idéia, só conduzirá a mais confusão e mais angústia.
E parece-me que temos em mãos uma imensa tarefa, tarefa que exige seriedade. Por esta palavra, entendo a capacidade de prosseguir até o fim na busca da Verdade ou numa pesquisa qualquer. Por não sermos verdadeiramente sérios, somos muito superficiais, fáceis de distrair e de satisfazer. Mas, para investigar profundamente em si próprio, o indivíduo tem de ser sério em extremo, e conservar-se nesse estado de seriedade. E isso requer energia; ninguém pode ser sério se não tem energia. Não deve essa energia ser esporádica, acidental, porém uma energia constante, capaz de observar um fato tal como é, e capaz de seguir esse fato até o fim — uma energia espantosa, tanto mental, como corporal.
E, para se ter energia, não deve haver conflito, já que o conflito é o principal fator de deterioração. Somos pessoas que foram educadas para viver em conflito. Toda a nossa vida é conflito, dentro e fora de nós — com o próximo, com nós mesmos, e em nossas relações. Tudo o que tocamos, tanto psicológica como ideologicamente, gera conflito. E o conflito é o maior fator de deterioração.
Ora, a meu ver, a compreensão desse conflito, compreensão não parcial porém total, é a mais importante tarefa da mente humana. Porque, só com a completa terminação do conflito podem terminar todas as ilusões; só então tem a mente a possibilidade de penetrar fundo, na investigação da Verdade, no investigar se algo existe além do tempo. E só essa mente é capaz de descobrir o que é o amor e de descobrir o estado mental criador, porque tudo o mais, em qualquer forma que seja, é pura especulação. A mente religiosa não especula; move-se, tão somente, de fato para fato. E não é possível observar o fato quando há conflito ou tensão de qualquer espécie.
Assim, creio que o nosso problema principal resulta de termos perdido completamente a religião, o espírito religioso. Vocês podem ter templos, frequentar o templo, usar vestes sagradas, cultivar todas as demais futilidades desse gênero; mas não são pessoas verdadeiramente religiosas. E o problema do mundo não pode ser resolvido em nenhum outro nível, exceto o religioso.
A vida verdadeiramente religiosa é aquela que vivemos na compreensão do conflito e libertados do conflito.
Nosso principal interesse, por conseguinte, é este: a compreensão do conflito interior e exterior. Esses dois ("interior" e "exterior") não são coisas separadas. O mundo não está separado de vocês e de mim; vocês são o mundo e o mundo é vocês. Isto não é uma teoria; se observarem bem, verão que é um fato real. Vocês estão condicionados pela sociedade em que vivem... Vocês são considerados como um indivíduo nascido neste país, educado de acordo com uma certa tradição, crendo ou não crendo em Deus. Vocês são moldados pela sociedade, pelas circunstâncias. Suas crenças, suas conduta, suas maneira de pensar, tudo é resultado do condicionamento de vocês pela sociedade em que vivem. Este é um fato óbvio, irrefutável. Mas, separamos o mundo como uma coisa diferente de nós, porque o mundo é forte demais, com todas as suas pressões, tensões e conflitos, com suas inumeráveis exigências e as condições da existência. E dele nos retraímos para dentro de nós mesmos, refugiando-nos em nossas crenças, nossas esperanças, temores, conceitos especulativos. Por isso há separação entre nós e o mundo. Mas, se observarem, verão que o mundo não difere de nós — é como a maré, que flui e reflui. Se não compreenderem o mundo exterior, não compreenderam o interior. E, para compreende-lo, devem observá-lo — não de um dado ponto de vista, porém, da mesma maneira como um cientista observa. O cientista só observa em seu laboratório, mas nós, entes humanos, devemos observar o mundo de cada dia, em nossas relações, em nossas atividades. E, como disse, para compreendermos toda esta existência complexa, tormentosa, desesperante — existência sem amor e sem beleza — temos de compreender o conflito.
Surge o conflito, decerto, quando há contradição — contradição de diferentes desejos, diferentes exigências, tanto consciente como inconscientes. Mas, em geral, estamos conscientes desses conflitos. E, se estamos conscientes, não temos solução para eles; por isso, tratamos de distanciar-nos deles, buscando refúgio na religião, no trabalho social ou em entretenimentos vários, tais como ir ao templo, ir ao cinema, ou beber. E só há possibilidade de se resolverem os conflitos, quando a mente é capaz de compreender a si própria.
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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill