[...] Dissemos que a nossa maneira de viver se tornou mecânica: o passado, com toda a experiência e todo o conhecimento acumulados, é a fonte do pensamento, e está constantemente a dirigir e a moldar a nossa ação. O passado e o futuro são inter-relacionados e inseparáveis, e o próprio processo de pensar é baseado nisto.
O pensamento é sempre limitado, finito; embora pretenda alcançar o céu, esse mesmo céu situa-se no quadro do pensamento. A memória é mensurável, tal como o tempo. Este movimento do pensamento nunca pode ser fresco, novo, original. Assim, a ação baseada no pensamento tem de ser sempre fragmentada, incompleta e contraditória. Precisamos de compreender profundamente todo este movimento do pensamento, e o seu lugar, a sua relativa importância, nas necessidades da vida quotidiana, coisas em que a memória tem de ser usada.
Qual é então a ação que não é um prolongamento da memória? É uma ação nascida da compreensão imediata e penetrante, do insight.
O insight não é uma dedução minuciosa, não é um processo analítico do pensamento, nem tem qualquer relação com a memória, que nos limita ao tempo. É um percebimento sem o percebedor; é uma percepção instantânea. A partir deste insight, a ação tem lugar imediatamente. A partir dele, a compreensão de qualquer problema é rigorosa, completa e verdadeira. Não há desapontamentos, não há reações. E uma compreensão absoluta. Não pode haver insight sem a qualidade do amor. Insight não é uma operação intelectual sujeita a argumentos e demonstrações. Este amor é a mais alta forma de sensibilidade — quando todos os sentidos florescem juntamente. Não se trata de uma sensibilidade aos desejos e problemas pessoais, que fazem parte da estreiteza da vida que se vive, mas de uma sensibilidade que é amor. Sem ela, o insight é completamente impossível.
O insight é holístico. Implica assim a totalidade, a plenitude da mente. A mente é toda a experiência da humanidade, o vasto conhecimento acumulado, com toda a sua capacidade técnica, os seus sofrimentos, ansiedade, dor, angústia e solidão. Mas o insight, a compreensão profunda está fora do alcance de tudo isto. Estar liberto do sofrimento, da tristeza, do isolamento, é essencial para que esta compreensão aconteça. O insight não é um movimento contínuo. Não pode ser aprisionado pelo pensamento. O insight é a mais alta inteligência, e a inteligência utiliza o pensamento como um instrumento. O insight é inteligência, com a sua beleza e amor. São realmente inseparáveis: são, de fato, uma só realidade. E esta realidade é o todo, o que há de mais sagrado.
Krishnamurti em, Cartas às escolas