A revolução interior ou
psicológica implica uma transformação completa, não só da mente consciente mas
também da inconsciente. Pode-se facilmente modificar o padrão externo da sua
existência, ou da sua maneira de pensar. Você pode deixar de pertencer a
qualquer igreja que seja, ou pode abandonar uma igreja para ingressar noutra.
Pode pertencer ou não pertencer a determinado partido político ou grupo
religioso. Tudo isso pode facilmente ser modificado pelas circunstâncias, por
seu medo, por seu desejo de maior recompensa, etc. A mente superficial pode ser
facilmente modificada, porém, muito mais difícil é efetuar uma alteração no
inconsciente — e é aí que se encontra o nosso problema. E o inconsciente não
pode ser alterado pelo anseio, pelo desejo, pela vontade. Temos de abeirar-nos
dele negativamente.
O examinar negativamente a
totalidade da consciência implica o ato de escutar; implica perceber os fatos
sem interferência de opiniões, juízos, condenação. Por outras palavras, requer
pensar negativo. A maioria de nós, por educação e experiência,, está acostumada
a ajustar-se, a obedecer, a seguir autoridades estabelecidas — autoridades
morais, éticas, ideológicas. Mas o que aqui estamos examinando exige que não haja
autoridade de espécie alguma; porque, assim que o indivíduo começa a
INVESTIGAR, já nenhuma autoridade existe. Cada momento é um descobrimento. E
como é possível a mente descobrir quando está sujeita à autoridade. A suas
anteriores experiências? Assim, pois, o pensar negativo significa devassar
nossas crenças assertivas, dogmáticas, nossas experiências, ansiedades,
esperanças e temores; significa ver tudo isso negativamente, isto é, sem o
desejo de alterá-lo ou transcende-lo, porém, observando-o simplesmente, sem
avaliação.
Observar sem avaliação significa
observar sem a palavra. Não sei se você já tentou alguma vez olhar uma coisa
sem a palavra, o símbolo. A relação das palavras com aquilo que elas descrevem
constitui o pensamento, o qual é reação da memória; e olhar um fato, SEM
palavras, é olhá-lo sem a intervenção do pensamento.
Experimente-o, uma vez. Ao sair
daqui, nesta manhã, olhe para as montanhas com seus capuzes de neve, ou ESCUTE
aquele rio, sem nenhum pensamento — o que não significa estar dormindo. Não
significa olhar com a mente “em branco”. Ao contrário, olhar uma coisa sem a
intervenção do pensamento requer que você esteja totalmente desperto. E esta é
uma tarefa árdua, porquanto você está condicionado, desde a infância, para
julgar, para avaliar. Estamos condicionados pelas palavras... através dessa
cortina de palavras olhamos e escutamos; por isso, nunca vemos, nunca ouvimos.
Eis porque é tão importante
libertarmo-nos da escravidão às palavras. Tome-se a palavra “Deus”. Temos de
ficar completamente livres dessa palavra, principalmente se nos considerarmos
pessoas religiosas ou espirituais; porque a palavra não é a coisa. A palavra “Deus”
evidentemente não é Deus; e para se compreender o que seja essa extraordinária
entidade, temos de ficar livres da palavra — o que significa ficar
interiormente livre de todas as influências e associações decorrentes dessa
palavra. Isso, por sua vez, não implica crer ou descrer; implica que não se
deve pertencer a nenhuma religião, nenhum sistema organizado de pensamento. Só
então temos a possibilidade de descobrir por nós mesmos se algo existe além das
palavras, além das medidas da mente.
Jiddu Krishnamurti — O homem e seus desejos em conflito