A mente é o resultado de muitos
séculos, de milhares e milhares de anos. Sempre funcionou no campo do conhecido.
Dentro desse campo do conhecido, não existe nada novo. Todos os deuses que a
mente inventou são do passado, do conhecido. Pode a mente, por meio do
pensamento, da inteligência, da razão, promover uma transformação?
Necessitamos de uma tremenda
mutação psicológica, não uma mudança neurótica; e a razão, o pensamento, não
pode realiza-la. Nem o saber, nem a razão, nem as sagazes atividades do
intelecto poderão operar essa radical revolução na psique.
(...) Se o pensamento, a razão, o
conhecimento e a experiência não podem realizar uma radical mutação na psique,
que é que poderá realizá-la? Tal é a única revolução que resolverá todos os
nossos problemas.
(...) Para examinar-se qualquer
coisa, principalmente coisas não objetivas, coisas interiores, necessita-se de liberdade,
de liberdade COMPLETA para olhar; e essa liberdade não é possível quando o
pensamento, como reação de experiências ou conhecimentos anteriores, interfere
no ato de olhar.
(...) Se você deseja olhar uma
flor, qualquer pensamento a ela relativo lhe impede de olhá-la. As palavras
"rosa", "violeta", o nome da flor, da espécie da flor, lhe
impede de olhar. Para você olhar, NÃO DEVE HAVER INTERFERÊNCIA DA PALAVRA, que
é a objetivação do pensamento. Você deve estar livre da palavra; o olhar exige
silêncio; de contrário, não se pode olhar. Se você olha sua esposa ou marido,
todas as lembranças que guardou, aprazíveis ou dolorosas, interferem no olhar.
Só quando olha sem a imagem, existe um estado de relação. Sua imagem verbal e a
imagem verbal de outra pessoa, não estão em nenhuma relação. São inexistentes.
(...) Para observar, precisamos
estar livres da palavra, sendo a palavra símbolo, com tudo o que encerra —
conhecimento, etc. Para olhar, observar, temos de estar em silêncio; de
contrário, como é possível OLHAR alguma coisa? Esse silêncio ou pode ser
produzido por um objeto tão imenso que torna a mente silenciosa; ou ele resulta
de que a mente compreende que, para olhar qualquer coisa, tem de aquietar-se.
Ela é então como a criança que ganhou um brinquedo novo, que a absorve
inteiramente. A criança torna-se quieta; tão interessante é o brinquedo, que a
absorve; mas, isso não é o estado de quietude. Tire-se-lhe o objeto da absorção,
e ei-la de novo irrequieta, a fazer barulhos e travessuras. Para olharmos
qualquer coisa necessitamos de liberdade; e a liberdade requer silêncio. A
mesma compreensão disso produz sua disciplina própria. Não há interpretação,
por parte do observador, daquilo que está a observar — sendo o
"observador" todas as ideias, memórias, experiências, que o impedem
de olhar.
O silêncio e a liberdade são
inseparáveis. Só a mente que está toda em silêncio — não por meio da disciplina
ou controle ou por causa da exigência de experiências extraordinárias, pois
tudo isso são futilidades — só a mente que está toda em silêncio pode responder
àquela pergunta. Só o silêncio total produzirá a revolução total na psique —
não o esforço, nem o controle, nem a experiência, nem a autoridade. Esse
silêncio é extraordinariamente ativo; não é mero silêncio estático. Para você o
alcançar, precisa fazer o necessário. Ou o faz instantaneamente, ou toma um
tempo para analisar-se e, nesse caso, você já perdeu o silêncio. A análise —
psicanálise ou auto-análise — não dá liberdade, tanto mais porque requer tempo
— de hoje para amanhã e daí por diante, gradualmente.
A mente — sua mente e minha mente
— é resultado do tempo, resíduo de toda a experiência humana, produto de nossa
infinda luta humana. Seus problemas são os mesmos problemas do indiano, na
Índia. Ele está passando pela mesma infinita aflição que você. Esse desejo de
encontrar a Verdade, de descobrir se é possível uma revolução radical na mente,
só será compreendido quando houver liberdade total e, por conseguinte, não
houver medo. Só existe a autoridade quando existe o medo. Com a compreensão do
medo, da autoridade e da rejeição de todos os desejos de experiência — e essa é
realmente a plenitude da maturidade — torna-se a mente completamente
silenciosa. Só nesse silêncio — que é SUMAMENTE ativo — pode verificar-se uma
revolução total na psique. Só então está a mente apta a criar uma nova
sociedade. Torna-se necessária uma nova sociedade, uma nova comunidade,
constituída de pessoas que, embora vivendo no mundo, a ele não pertençam. A
você é que cabe o dever de criar essa comunidade.
Jiddu Krishnamurti — A
importância da transformação