Krishnamurti: O observador é o
passado; ele é o passado, a lembrança, a experiência, o conhecimento armazenado
na memória. O passado é o observador, e eu observo o presente, que é o meu
ciúme, a minha reação. E uso a palavra "ciúme" para esse sentimento
porque o reconheço como tendo acontecido no passado. É uma lembrança do ciúme
através da palavra, que faz parte do passado. Portanto, posso observar sem a palavra
e sem o observador que é o passado? A palavra traz este sentimento ou há
sentimento sem a palavra? Tudo isso faz parte do autoconhecimento.
Pupul: Como alguém pode observar
sem a palavra?
K: Sem o observador, sem nenhuma
lembrança. Isso é muito importante .
P: Como se pode resolver o
problema do observador?
A: Posso dizer que na
observação do observador há também a desaprovação ou a aprovação do observador
a respeito dele mesmo.
K: Isso é o passado. Isso é o seu
condicionamento. Esse é todo o movimento do passado, que está contido no observador.
A: Essa reprovação é a barreira.
K: Isso é o que Pupul está
perguntando. Ela diz: Como eu observo o observador? Qual é o processo de
observar o observador? Ouço K dizer que o observador é o passado. É isso mesmo?
P: Ao fazer essa pergunta, outro
observador é criado.
K: Não, eu não crio nada. Estou
simplesmente observando. A pergunta é: o que é o observador? Quem é o
observador? Como observo este microfone? Eu o observo através de uma palavra
que usamos para indicar que isto é um microfone; ela está registrada no cérebro
como microfone, como uma lembrança; eu uso essa palavra para expressar a
realidade do microfone. Isso é bastante simples.
P: Alguém observa o observador?
K: Já vou falar sobre isso. Como
alguém observa o observador? Vocês não o fazem.
P: É a incapacidade de observar o
observador o que dá a alguém a compreensão da natureza do observador?
K: Não. Você não observa o
observador. Você só observa "o que é", e a interferência do
observador. Você diz que reconhece o observador. Percebe a diferença? Vá
devagar. O ciúme existe. O observador entre e diz: "Eu tive ciúme no
passado. Eu conheço esse sentimento." Portanto, eu o reconheço e ele é o
observador. Você não pode observar o observador por si mesmo. A observação do
observador existe apenas em na sua relação com o observado. Quando o observador
para a observação, então há a consciência do observador. Você não pode observar
o observador. Você só pode observar o observador em relação a algo. Isso está
razoavelmente claro. No momento do sentimento, não há nem o observador nem o observado;
há só aquele estado. Então, o observador chega e diz que se trata de ciúme e
continua a interferir naquilo que existe, evita o ciúme, reprime, racionaliza,
justifica-o ou foge dele. Esses movimentos indicam o observador em relação
àquilo que é.
FW: No momento em que o
observador existe, existe a possibilidade de observar o observador?
K: É isso que nós estamos dizendo.
Eu estou zangado ou violento. No momento da violência nada existe. Não existe você,
nem observador, nem o observado. Há só o estado de violência. Então, o
observador chega ao que é o movimento do pensamento. O pensamento é passado —
não existe pensamento novo — e esse movimento do pensamento interfere no
presente. Essa interferência é o observador, e você estuda o observador só
através dessa interferência. Ele tenta fugir do que é irracional na violência,
para justificá-la e assim por diante, e todas essas são abordagens tradicionais
ao presente. A Abordagem tradicional é o observador.
P: Desse certo modo, portanto, o
observador só se manifesta em termos de fuga ao presente.
K: Fugas ou racionalizações.
D: Ou interferências.
K: Qualquer forma de interferência
no presente é a ação do observador. Não admita isso. Acabe com ela, descubra
essa ação.
Par: Se não há passado não há
interferência?
K: Não, não é essa a questão. O
que é o passado?
P: O conteúdo acumulado e
armazenado das minhas experiências.
K: E isso é o que é? Suas experiências,
suas tendências e motivos, tudo isso é atividade do passado, do conhecimento. A
atividade do passado só pode acontecer através do conhecimento, que é o
passado. Portanto, o passado interfere no presente; o observador começa a agir.
Se não há interferência, não há observador, há apenas observação.
Na observação, não há nem o
observador nem a ideia de observação. É muito importante que se entenda isso.
Não há nem observador nem ideia de não ter um observador; o que significa que
há só observação pura, sem a palavra, sem a lembrança, sem relação com o
passado. Não há nada senão a observação.
FW: Dessa forma, é possível a
observação do observador?
K: Não, eu digo: A observação do
observador só acontece quando o passado interfere no presente e o observador entra
em ação. É só então que você toma consciência de que existe um observador.
Agora, quando você percebe isso, quando tem um vislumbre disso, então, não há
observador; há apenas observação.
Jiddu Krishnamurti — Diálogos sobre a visão intuitiva
P - Pupul
A- Achyut
FW - Fritz Wilhelm