Pergunta: Negais a importância de todas as religiões bem como das
instituições, sejam elas religiosas, sejam de serviço humanitário?
Krishnamurti: Não nego
coisa alguma. Afirmo que as religiões são pensamentos solidificados dos homens,
em virtude dos quais constroem templos e igrejas. As religiões são formas de
pensamento sistematizado; como, porém, pensamento é Vida, não o podeis
capturar. Pelo fato de amarrardes a Vida em códigos, crenças estabelecidas,
credos e religiões, é que se dá a confusão, o conflito e a tristeza. A Vida é
livre e, se tentardes ligar a Vida por meio da religião, a qual é uma forma
sistemática de pensar, matá-la-eis.
Desejo libertar o homem do temor,
leva-lo a confiar em si próprio, a mostrar que é senhor de si mesmo, que é
responsável pelas suas ações, pelos seus pensamentos, pela criação de sua
tristeza e da sua felicidade. Dado, porém, ele gostar de se auto enganar, de se
abrigar à sombra confortável dos templos religiosos, não tem compreensão; e daí lhe vem a tristeza e a luta continua.
Ora, para auxiliar
verdadeiramente, com entendimento, precisais superar a necessidade de buscar
auxílio de outrem. É fácil o mergulhar numa condição em que estejais sempre
trabalhando. Dizem-me que certas pessoas só são felizes quando estão
trabalhando. Expôs-me certa vez um amigo que todos os membros de sua sociedade
tinham sido postos a trabalhar e, assim, finalmente, encontraram um processo
por meio do qual podiam libertar sua energia. Porque haveis necessariamente de
trabalhar?
Porque quereis alterar as
circunstâncias ou o pensamento de outras pessoas? Será por haverdes vós
encontrado a Verdade, por terdes atingido esse entendimento que vos proporciona
autoridade para falar da Verdade por vós mesmos e não pela autoridade de outrem? Ou
porque pretendeis esquecer a vós mesmos, furtar-vos ao exame crítico próprio,
engolfando-vos no trabalho? Tendes que responder por vós mesmos a estas
perguntas.
Servir é coisa natural, é essencial
e belo; porém, servir sem a compreensão, com o desejo de impor aos outros vossa
forma particular de pensamento, é simplesmente interferência. Se viverdes com
compreensão, haveis de trabalhar e servir. Se meramente trabalhardes, então não
estareis vivendo. Se viverdes como deveis, estareis servindo e, é pelo fato de
não estardes vivendo com propriedade que surgem todas as perguntas.
Pergunta: Porque falais contra sociedades e instituições religiosas?
Krishnamurti: Se
quiserdes atingir a felicidade que é eterna, por meio da libertação, tendes que
abandonar todas as limitações de pensamento e do amor. Há muitos caminhos e
vias para a compreensão dos valores transitórios, porém, para a compreensão da
Verdade só há um caminho, que é o intenso e inquebrantável desejo pela própria
Verdade. Pois que a Verdade, é uma terra sem caminho e somente no mundo da ilusão,
da impermanência, é que existem muitos caminhos. É desta Verdade que falo. O
restante é semelhante às sombras que se projetam nos campos; podeis
atravessá-las porém elas não vos conduzirão à Vida. Somente por meio da simplicidade
da mente e do coração é que podereis realizar o Eterno.
Vós, por não estardes habituados
à real liberdade, tendes vos contentado em enfeitar os homens que formam a
grade de vossa gaiola humana, em vez de sairdes para o ar livre, para os céus
abertos, para os campos sem fim.
Tendes imaginado que as igrejas,
as sociedades, as religiões, são necessárias para a vossa força. Eu falo da
Vida que é eterna, e vós quereis que eu a encerre dentro dos limites das vossas
gaiolas. Atribuis-me antagonismo e destruição, porque vos digo que a Verdade
não pode ser confinada, nem tampouco se pode faze-la servir aos supérfluos propósitos
do homem.
Krishnamurti em reunião de perguntas e respostas, 1931