Pergunta: Existe alguma diferença entre Vida e expressões da Vida? Não
é toda a coisa uma expressão da Vida? E, se assim é, seria possível atingir a
realização da Vida por meio de qualquer experiência simples? Ou deve a
realização vir pelo penetrar profundo da nossa consciência?
Krishnamurti: Não há
distinção entre matéria e espírito. Apraz-vos pensar que quando tiverdes
abandonado o tumulto deste mundo, que vós próprios haveis criado, estrareis no
mundo do espírito, no qual não existe conflito. Estais, portanto, assim,
criando continuamente um motivo para a vossa ação e jamais existe um viver
completo no presente.
Toda experiência no presente —
experiência é a reação do desejo pessoal, que é ânsia — vos concederá seu pleno
significado se estiverdes vigilantes, alerta. A experiência não é mais do que
uma série de reações e, quando estiverdes livres dessas reações, não mais
existirá experiência, porém sim, uma penetração contínua. Para penetrar
profundamente, pacientemente e com diligência, tendes que atravessar as
múltiplas camadas da eu-consciência, que são a causa da reação. Necessitais
conhecer por vós próprios que estais colhidos na limitação das ideias, das
reações. Quando houverdes feito face à vossa limitação, sabereis como lidar com
dela, pois que não tentareis dela fugir, não mais perseguireis a um oposto.
Tendes que tratar com aquilo que está no presente, e somente através do
presente existe a realização da eternidade. A eternidade não está no futuro,
que é a individualidade prolongada; está no incessante presente.
Pergunta: Quando um indivíduo realiza sua unidade, integridade,
perfeição, ficará curado de seu corpo? Pode a imperfeição física continuar após
a Vida se haver liberto da personalidade?
Krishnamurti: Todas as
formas compostas se gastam. Eu vos estou falando de libertar-se da distinção
entre “meu” e “teu”, que cria resistência e tristeza. A Vida não conhece
distinção de duração e cessação, começo e fim; estas coisas duram somente
enquanto houver em vós a ânsia, o empolgamento. Quando a mente estiver
completamente liberta da ideia de aquisição, haverá harmonia; não unidade, a
qual implica dualidade, mas sim a cessação da distinção produzida pela ânsia.
Pergunta: Li o “Reino da Felicidade”, e a “Vida Liberta” muitas vezes;
li também “O Amigo Imortal” e “A Busca”. Estas obras me inspiram; ensinam e
apontam a via que tenho a trilhar. Sei que tenho de fazer sozinho este esforço,
porém esse escritos me trazem uma doce paz. Vossos últimos escritos contidos no
Boletim da Estrela parecem-me muito frios, mais abstratos e carentes da doçura
dos quatro livros que mencionei. Estarei enganado em algum ponto de minhas
observações? Estou falhando no sentido de manter-me alerta?
Krishnamurti: Sinto que
assim seja. Vós não gostais que vos coloquem em posição desconfortável, para
pensardes e sentirdes por vós mesmos. Gostais de adorar um quadro; ler um livro
familiar, pois que tais coisas não vos contradizem. Preferis ser um discípulo
antes do que a própria Vida, a qual é imutável mutação. Se vos apegardes aos
livros, eles não terão valor. Não podereis conhecer a beatitude da Verdade pelo
serdes mentalmente estimulados ou emocionalmente varridos. Tendes que vos
tornar alerta, vigilantes, estar atentos. A maioria das pessoas se esforçam
continuamente para evitar fazer face à sua própria vacuidade. Estão assim se
esforçando para evitar a solução de seus próprios problemas, por meio de uma
fuga como a do culto, perseguindo intelectualmente uma ideia ou buscando um
excitamento emocional. Enquanto que, só podeis realizar
a harmonia perdurável penetrando dentro de vossa própria solidão.
Pergunta: Frequentemente vos encontro dizendo coisas que por mim mesmo
eu já havia mentalmente elaborado. Será imitar-vos ou seguir-vos, utilizar tais
pensamentos?
Krishnamurti: Certamente
que não, se ele é o vosso próprio pensamento. Verificai se o vosso pensamento é
propelido pelo desejo; se assim não for, então o pensamento não será nem vosso
nem meu.
Krishnamurti, Acampamento de Ojai, 7 de junho de 1932
Krishnamurti, Acampamento de Ojai, 7 de junho de 1932