Pergunta: Dizeis que, ao passo que a Verdade somente pode ser abordada
por meio do esforço individual, o trabalho, por outro lado, tem que ser
coletivo e organizado conforme a autoridade. A Fraternidade Oculta dos Adeptos
e um grupo de homens que, como vós, se libertaram de todas as limitações e
atingiram a Verdade; como vós, porém, empreenderam eles certa espécie de
trabalho por eles próprios colhido no sentido de promoverem o avanço do bem
estar no mundo. Eles inspiram grandes reformas em cada departamento da vida e
trabalham segundo métodos dos quais pouquíssimo é conhecido, os quais são,
porém, imensamente eficazes. Sua cooperação é completa, sua organização
perfeita, reconhecem uma regra absoluta, porém, na Vida, são inteiramente livres.
Um tal modo de viver parece o resultado lógico de vossos ensinos. Negais
porventura que seja assim? Ou o vosso desafio se dirige antes à confusão
popular da Verdade, com o trabalho instituído para o serviço da humanidade?
Krishnamurti: Em primeiro
lugar necessitais compreender o que eu entendo por trabalho organizado e
coletivo. Explicais que existe uma fraternidade oculta que organiza o trabalho
para a humanidade, afim de acrescentar o bem estar ao mundo. Para afirmar isto,
existem aqueles que possuem o conhecimento, que realizaram a Verdade e em
virtude dessa realização, servem-se de métodos os quais, como se diz, pouquíssimo
se sabe, escolhendo mensageiros e agentes especiais para executarem seu trabalho
e inspirarem instituições, que são dignas disso — para mim, tal presunção
baseia-se sobre uma ilusão, levando o homem à exploração, em pro do seu “bem”.
A realização da verdade somente é possível para o indivíduo, em virtude de seus
esforços individuais. O homem que realizou a Verdade torna-se uma chama que
consome essa ilusão de que essa realização da verdade, a completude, pode ser
instituída por outrem.
Acreditais em divisões e
distinções físicas, bem como em divisões e instituições espirituais e aplicais
a ideia de divisão à Verdade, que é completude; dizeis que existem certos indivíduos
que vos podem proporcionar a Verdade por saberem mais do que vós outros. Sois
vós que tendes que buscar a Verdade, ninguém vo-la pode dar. Se alguém vo-la pudesse
dar, seria isso uma exploração. Por favor, compreendei isto, que tendes que
estar em revolta inteligente para buscar a Verdade e não podeis ter em vista a
outrem para a sua realização. Eu nego que a Verdade possa ser encontrada por
intermédio de outrem, por maravilhoso que seja esse outrem, por perfeita que
seja a sua instituição. Eu digo que a Verdade está em vós mesmos. Essa eterna
completude pode somente ser realizada mediante os vossos próprios esforços, não
através e outrem, nem mesmo outra pessoa vo-la pode transmitir.
Baseais vossas reformas sociais
também neste falso conceito. Dizeis: “sou um pobre indivíduo ignorante, e vós,
sendo mais sábio e mais rico, deveis formar instituições para mim”. Eu posso
vos auxiliar a dissipar a ignorância, porém, sois vós que tendes de aprender
por vós próprios; a sabedoria é o fruto de vossa própria colheita. Esta ideia
de “dar” e “tomar” nada mais é que exploração, egoísmo. Eu não vos estou dando
a Verdade, não estou criando para vós uma instituição perfeita. A Verdade
somente é perfeita por ser eterna; ela não é relativa, está para além do tempo;
porém as instituições entram dentro da limitação do tempo, portanto, jamais
podem ser perfeitas. Estou tentando vos ajudar a derrubar vosso anseio de olhar
para outrem em busca da realização da Verdade. Sois vós próprios que criam o
explorador e o explorado, porque esperais auxílio de outrem. Quando olhardes para
a verdade em vós mesmos, por meio de vosso próprio entendimento, por meio de
vosso próprio conflito, por meio de vosso próprio sofrimento, de vossas
alegrias, não mais criareis ilusões e não tereis falsas percepções da vida.
Ninguém vos pode proporcionar a realização espiritual e a completude. Estou me
esforçando por explicar-vos as ilusões que haveis construído ao redor de vós
mesmos, estou tentando auxiliar-vos a dissipá-las a fim de que por vós mesmos,
percebais a completude; não estou esforçando-me para vo-la dar. Se
compreenderdes o princípio de que em vós mesmo existe a completude, que pelos
vossos próprios atos, pelos vossos próprios conflitos, pelo vosso próprio
entendimento, é que há de vir a realização última da verdade; então derrubareis
as inúmeras barreiras que por vós mesmos haveis criado.
Krishnamurti, 4 de agosto de 1931