Pelo fato de não haver em vós o
fundamental desejo de vos alterardes a vós mesmo, cresce o anseio de seguir
alguma outra pessoa; daí, surge um grupo de indivíduos que a si mesmos modelam
de conformidade com essa outra pessoa. Onde houver proselitismo, haverá
autoridade e essa autoridade torna-se lei, em substituição ao julgamento individual.
Tenho dito repetidas vezes: não aceiteis coisa alguma do que digo, nem tampouco
me coloqueis sobre um pedestal, nem me torneis como autoridade. Quando digo que
realizei a Verdade, peço-vos que compreendeis, que não faço para afirmar
autoridade, mas simplesmente para dar a entender que o que realizei pode ser
realizado por todos os que tiverem intenso desejo de encontrar a Verdade. A
maioria dentre vós, acredita em milagres, isto é, em algo fora do normal e por
isso dizem: “Foi algum super-homem que se apossou de vós”; ou então: “Haveis
sido instruído em muitas experiências, por isso a realização de vos tornou
fácil”. Parece que a pesquisa do miraculoso, do extraordinário, vos preocupa
antes do que o entendimento da existência, a aplicação daquilo que eu digo às vossas
vidas. Eu vos peço que compreendeis, que não pretendo vazá-los em meu molde,
pois a Verdade não se realiza por meio da imitação. O ser vós próprios é ser
realmente livres; isto é, a realização vem por meio de vossa própria força, pela vossa
própria capacidade, pelo vosso próprio esforço e não pela instrução miraculosa,
nem pela direção de super-humanos. Quando houverdes libertado vossa
eu-consciência, sereis como a rosa que é bela por si mesma e por isso é a flor
perfeita.
Temo que muitos do que aqui se
acham, apenas estejam repetindo minhas palavras sem a contribuição de seu
pensamento individual, de seu esforço próprio para por si mesmos encontrarem essa
Realidade de que falo. Quando naturalmente chegardes a ser vós mesmos, sem
pretensão, sem a presunção de ser extraordinário; quando não mais tiverdes
medo; quando realmente estiverdes desprendidos e, por esse fato, absolutamente
isolados sem sentir o isolamento, então a compreensão da vida vos chegará.
Quando vós, em quem a Vida mora, em quem a Totalidade habita, não mais
estiverdes buscando a satisfação dos opostos, realizareis a completude. Agora
estais apanhados nos opostos. Buscais estabelecer o equilíbrio entre ambos em
vez de vos libertardes de ambos. Se buscardes o equilíbrio entre os opostos,
não o encontrareis; porém, no vos libertardes dos opostos, um novo entendimento
será criado. A Libertação não significa harmonia dos opostos, porém sim, a total abolição da
eu-consciência que cria divisão. Logo que estiverdes livres dos
opostos, sereis ricos, não na separação mas na liberdade. Isso não pode ser
atingido por meio da imitação de minhas ideias, porém somente mediante o vosso
exame individual delas, pela vossa constante vigilância e pelo vosso esforço no
sentido de vos libertardes dos padrões e dessa autoridade interior criada pelo
medo. Para serdes realmente vós próprios, tendes que de vós próprios vos tornar
conscientes, conscientes daquilo que vós próprios pensais. Averigue se estais
sofrendo e qual a razão de vossa tristeza, se estais no prazer ou na dor, se
estais atemorizados ou buscando evitar a solidão. Enquanto evitardes o
isolamento, jamais alcançareis essa solidão que é o êxtase real, que está para
além da ideia do isolamento. Nesse êxtase de isolamento não há solidão, porém,
ao contrário, há a riqueza que provém da compreensão dos opostos. Essa
compreensão é a essência comum de todas as coisas, é a completude.
E digo que isto não se torna
realidade por meio de cultos, pela autoridade, pelo vos amoldardes a mim ou a
qualquer outra pessoa. Isto pode somente ser descoberto pela vossa própria
integridade de propósito, pelo vosso próprio exame quanto aos vossos secretos
desejos, pelo reconhecimento pessoal de vossos próprios embaraços, os quais vos
conduzirão à riqueza do entendimento. Isto somente pode realizar-se se puderdes
suportar o isolamento que conduz à solidão — solidão que não é afastamento, que
não se dá por medo, que não é evasão, porém solidão que advém quando já
estiverdes interna e absolutamente livres, desapegados, e isentos de temor.
Krishnamurti, verão de 1931