Pergunta: Ao falar a pessoas do exterior, que desconhecem a lei da
reencarnação, e que não têm noção da gradatividade das vidas sucessivas, é
difícil tornar clara a ideia da libertação e o longo processo para a perfeição
no homem. Existe um abismo em sua compreensão, e a libertação parece-lhes
impossível de atingir. Para que essas pessoas possam averiguar a ação lógica da
evolução, poderíeis nos explicar como esclarecer sua falta de compreensão.
Krishnamurti: Em primeiro
lugar, eu vos sugeriria que vos assegurásseis bem quando à vossa própria compreensão.
Tentai vós mesmos compreendê-la. Esforçai-vos por prosseguir cuidadosamente
neste sentido e verificareis que simples isto é. Julgais que o tempo nos virá
proporcionar entendimento; que no fim de uma série de experiências chegareis a
compreender. Isto é, pensais que tendes tempo para crescer em compreensão. Ora,
o tempo não vos pode proporcionar a compreensão; o que dá compreensão é o
entendimento de uma experiência realizada no presente, e não o prolongar essa
experiência pelo tempo. Quando a morte entra na minha família, se eu não
possuir a compreensão da tristeza, do isolamento e do conflito entre afetos, no
presente, se com ele não me debater no presente, se não travar a luta entre o
isolamento e o afeto no presente, o adiar do meu esforço para o futuro não
criará em mim o entendimento. No entanto é isso que todos vós fazeis. Dizeis: “Se
meu irmão morrer eu me unirei a ele em outro plano, em qualquer outra parte”.
Isto vos proporciona uma satisfação momentânea, e vos dá conforto. Se, porém,
realmente estiverdes prisioneiro da tristeza, este adiamento da compreensão da
tristeza, esta unidade, como a denominais, não vos fará compreender. O que vos
proporciona entendimento é o vosso próprio desejo, o vosso próprio êxtase, a
vossa própria luta, vossa própria força para derrubar as barreiras do tempo e,
para isto necessitais de tempo, não no sentido de continuidade, porém de tempo
para tornar-se consciente.
Se, por exemplo, fazeis qualquer
coisa, em vez de buscardes motivos para a ação, quereis passar imediatamente
adiante, praticar outro ato, evitais pensar no presente. Buscais a compreensão
através do tempo, e o tempo, é uma série de vidas, uma série de experiências.
Vós, como egos, como personalidades, como indivíduos, desejais vos apegar à vossa
identidade na vida próxima, porque imaginais que a próxima vida vos dará novas
oportunidades de compreensão. Ao manter essa ideia, acontece que não estais
vivendo no presente, ajustando-vos ao presente, tornando-vos vitais no
presente, mas simplesmente adiando o esforço, por ignorância ou preguiça.
Eu não pretendo que aceiteis o
que digo, tal como haveis aceito a reencarnação. O que acreditar ou não na
reencarnação, é coisa de pouquíssima importância.
O que é importante é se vós que estais me escutando, — vos não o vosso próximo
— se vós que prestais atenção ao que vos estou dizendo no momento presente, se
vós estais ou não vivendo nesse agora que é toda a Vida. A mente inventa o
tempo dando-lhe a forma de progresso, como orientação em direção à Verdade;
enquanto que, para mim, não existe progresso no sentido de orientação para a
Verdade, para a completude. Não pode haver progresso em direção àquilo que
sempre está presente. A ideia de orientação, de dar passos em direção a algo,
coisa que mais não é senão outra forma de aquisição, de obtenção, é falsa.
Se encarardes a vida, não sob o ponto de vista da continuidade do ego que mais
não é que ilusão, porém sob o ponto de vista da Verdade, haveis de verificar
que podeis plenamente compreender toda a experiência no presente; e uma encarnação será o bastante para
alcançar todo o significado da Vida. Portanto, vivei o todo no presente. Se a vossa mente
estiver continuamente preocupada com adiamentos, esta repulsa do conflito sem
fazer esforço no presente, fará que jamais compreendais. Se, porém,
vossa mente estiver realmente buscando, inquirindo a Verdade, se for adaptável,
plástica, enérgica, verificareis que o
tempo é uma ilusão, que o todo da existência se acha contido num único
minuto de compreensão, e a esta compreensão não se chega por meio do tempo, e
sim pela vitalidade de vosso próprio desejo no sentido de compreender a
experiência no presente. Este conhecimento, que é o começo da sabedoria, deve
ser baseado na percepção de que a Verdade não é coisa externa ao homem; e que a
partir do momento que a si próprio ele tenha liberto da estupidez, do seu amor
pelas posses, de seu egoísmo, nesse momento realizará ele o seu preenchimento
no presente. O conhecimento de que a Verdade está no presente, não no futuro,
que não existe ser supremo externo à Realidade que está no homem; e que esta
Realidade não conhece tempo, não conhece divisão, não conhece unidade, não
conhece separação — este conhecimento será o começo da sabedoria.
Krishnamurti em, 31 de julho de 1931