Pergunta: Dizeis que uma única experiência de amor, de nascimento ou de
morte, contém toda a Vida. Ser, porém, capaz de extrair dessa experiência única
seu conteúdo total, representa o haver já desenvolvido a intuição até o seu
mais alto grau e ter-se, portanto, tornado um ser evoluído. Não tendo ainda
atingido esse estágio de entendimento, como retermos o momento passante e
fazê-lo ceder seu tesouro integral?
Krishnamurti: Para andar
um cento de léguas, tendes que dar o primeiro passo. A intuição é a
inteligência altamente desperta e, portanto, está para além das limitações da
personalidade, da eu-consciência. A capacidade de discernir o essencial e
ocupar-se desse essencial, vos conduzirá àquilo que eu denomino intuição.
A intuição nada mais é do que o
instinto altamente apurado; e, posto que todos possuam instinto, esse instinto
tem de ser amoldado à razão, e, quando a razão se torna impessoal, nasce então
a sabedoria e a intuição é a verdadeira expressão da sabedoria. Achando-vos
repletos de instintos, tendes que, primeiro, vos tornar conscientes desses
mesmos instintos para depois, pelo contínuo
ajuste e auto-recolhimento, vos aperceberdes dessa completude, a causa
única que vos pode proporcionar a realização eterna.
Tornando-vos assim concentrados,
podereis aprender de toda a experiência o completo significado da Vida. Esse
entendimento do significado de uma experiência não é privilégio de uns poucos,
dos evoluídos apenas. Vossa ideia da evolução é a de contínuo crescimento em
direção a certa coisa, o que vem a significar que estais ainda encarando as
coisas a partir desse circulo de eu-consciência. Se procurardes a Verdade a
partir daí, jamais a encontrareis. É com o vos libertardes desse circulo que
alcançareis a compreensão. A intuição vem com a diligência, pelo contínuo
ajuste e apercebimento. Não é um milagre, uma dádiva; portanto, retirai da
vossa mente esta ideia de progresso em direção a uma Realidade última,
retirai-a também de vossas obras. Começai a vos tornar conscientes, a vos
tornar responsáveis. Até ao presente apenas tendes seguido, por medo, os
ditames de outrem; agora tendes que vos tornar lei em vós mesmos e isto é muito
mais difícil, exige maior determinação, maior energia, maior potencia de
pensamento. A intuição que é pura ação da vida, da qual toda a “eu-dade” se
encontra por completo removida, somente pode ser realizada por meio de vossa
paciente, constante, diligente vigilância, para jamais deixar passar um segundo
sem saber o que se está pensando e o que se está fazendo e removendo de vosso
pensamento, essa ideia de “eu-dade” criada pelas falsas ideias sobre a
sensação. A intuição manifesta-se como o raiar do sol, não se faz esforço algum
para realiza-la; ela é coisa natural que
vos envolve, não no tempo, sob a forma de duração, porém que vos envolve no
presente, em virtude do vosso próprio esforço para vos libertardes da
eu-consciência.
Krishnamurti, 30 de julho de 1931