Pergunta: Haveis mencionado certas coisas, métodos e ideais como nada
tendo que ver com a Verdade — como sejam, por exemplo, instituições, igrejas,
cerimonias e a concepção de um Salvador pessoal. Desde, porém, que a Verdade
está em toda a coisa em sua completude, como vos é possível colocar de lado
estas coisas especiais e dizer serem elas “diametralmente opostas” àquilo que
sustentais ser a Verdade?
Krishnamurti: A
completude existe em toda a coisa, porém todo o ser humano que ande em sua
busca é colhido pelas ilusões e por meio de seu próprio egoísmo cria ele um
salvador fora de si mesmo. Posto que a completude nele próprio onde ele coloca
esta Realidade última fora de si.
O externar desta completude que
nele próprio está, é ocasionada pela sua ilusão da autoconsciência. Isto é um
fato. Estais pondo isto em prática a todo o instante. Quando colocais a um
salvador, um deus, a Vida, a Verdade, fora de vós, quando colocais a felicidade
fora de vós, é pelo fato de em vós existir a autoconsciência criando a separação.
Desta separação provém o desejo de culto; as instituições surgem, supondo-se
que conduzem à Verdade e os Salvadores vem à existência pelo fato de buscardes
a Verdade por toda a parte exceto dentro de vós mesmos. Sei que direis: “Não
necessitamos destas coisas para nós, porém elas são boas para os outros; nós
estamos libertos, porém, os menos evoluídos necessitam destas coisas”. Isto
nada mais é do que criar decepções para si mesmo, conducentes à exploração, do
superior que dá algo ao que lhe é inferior. Não se trata de dar e tomar. Quando
me servi das palavras “diametralmente oposto”, tive em vista, como já
expliquei, não algo em oposição às vossas crenças, porém essa completude que
está liberta de todas as crenças. Como disse, o “Eu” vem ao ser por meio da
existência corpórea, isto é, do corpo, da sensação, da percepção. Ora, a
percepção, é o poder de criar ilusões. Não podeis criar a Verdade, mas podeis
criar ilusões. Pelo fato de tornardes a Verdade uma coisa exterior, pelo fato
de existir em vós a eu-consciência, o egoísmo, pensais que as instituições, os
salvadores, as cerimonias vos são necessárias. É uma forma gloriosa de exploração, esta ilusão
de receber certa virtude ou poder de transmitir a outros para seu beneficio.
Portanto, tendes que vos libertar deste poder de criar ilusões, e então
encontrareis a Realidade, chegareis a essa realização.
Krishnamurti, 4 de agosto de 1931