Pergunta: Quando há sofrimento no coração pelo fato de se não poder
concordar com as convicções que são caras a outrem, será melhor, por
consideração, evitar o choque das divergências, nos será este choque necessário
e útil afim de abrirmos o entendimento às convicções de outrem?
Krishnamurti: Não é caso
de entrar em conflito com outrem, porém sim da maneira de vós próprios
chegardes ao entendimento. O modo pelo qual fazeis as coisas, eis o que
importa. Se não reparardes por ser eu demasiadamente pessoal, exporei as coisas
a meu modo; talvez assim compreendais melhor: sei, de mim mesmo, que estou
fazendo a certa coisa que sustento ser correta e, naturalmente, por isso, entro
em conflito com a maioria dos meu amigos. Dar-me-á esse choque de entendimento?
Não. O que me proporciona a compreensão, é se em minha pesquisa da Verdade, se
em minha realização, eu sou sincero
comigo mesmo. A partir do momento que para comigo seja falto de
sinceridade, estarei ferindo a outrem. Portanto, o que importa não é o ferirdes
a outrem, em virtude do choque que determinais, o que importa é que mantenhais
vossa independência de pensar, vossa independência de agir. Pelo fato de não
quererdes que outrem vos siga e por não repousardes em outrem para vosso
encorajamento ou simpatia, sereis independentes; e portanto, sereis
perfeitamente livres de progredir vosso próprio caminho sem determinar feridas,
embora caminheis em direção diferente.
Se em vosso coração possuirdes
real afeto, ainda mesmo que se dê o choque, vosso afeto se manterá. Deixai que
tome um exemplo: um de meus grandes amigos gostaria que eu desenvolvesse a
realização da verdade usando certas frases, isto é, por certa maneira peculiar.
Ora, quando sigo meu próprio caminho — e peço-vos, compreendei, quando digo “meu
caminho”, e eu não tenho “caminho” o “meu” não existe — naturalmente ele
sente-se ferido e por causa deste sentimento desenvolve-se certa frieza em sua
atitude. Pessoalmente, eu não repouso no meu encorajamento, pois sustento que
não vos é dado repousar em outrem, seja ele quem for, para vossa força. No
buscar a Verdade, necessitais ser integralmente independentes de todos e esta
independência manifesta-se por meio de vossa pesquisa. Portanto, se eu possuir
afeto no coração, ficaremos amigos; amigos no sentido de nos encontrarmos
ocasionalmente, não há ressentimentos, portanto, não há choque, posto que meu
amigo saiba que eu não me afaste uma polegada daquilo que sustento ser
verdadeiro.
Se existir afeto em vosso
coração, não importa o entrardes ou não em conflito tendo a tendência de entrar
em conflito, porque existem no mundo muitas falsas ideias, muitas ilusões;
mantendo, entretanto, de contínuo, vossa pesquisa, chegareis, realmente a um
determinado entendimento nascido da sabedoria, e esse é amor.
Krishnamurti na fogueira do
acampamento, 29 de julho de 1931