A estrutura psicológica social é o que somos
[...] PERGUNTA: O que vossas palestras significam é o ‘‘advento de um homem novo”? Se assim é, esse homem novo irá “para diante”, e seus problemas serão completamente diferentes?
KRISHNAMURTI: [...] Que entendeis por “ir para diante”? Quereis dizer “progredir”? Parece-me que só há progresso no mundo material. Do carro de bois ao avião a jato, ao foguete que irá à Lua — isso é progresso na tecnologia. Mas existe progresso interior? Há progresso “espiritual”, significando que, através do tempo, uma pessoa se tornará algo psicologicamente? Ora, por certo, esta mesma ideia de “vir a ser”, “progredir”, “ chegar”, cria um problema. Desejais “chegar”, e pode acontecer ser isso impossível; existe, pois, sempre, a sombra da frustração. A mente livre, aquela que compreendeu a ânsia de progresso através do tempo, já nenhum problema tem. Se houver dificuldades, enfrenta-as prontamente; por outro lado, ela não cria nem “projeta” problemas para si própria. Mas em maioria estamos carregados de problemas por nós mesmos fabricados.
Deixai-me expressá-lo de outra maneira.
Se a mente está livre do “conhecido”, ela é uma mente nova, purificada. Acha-se num estado de criação, imensurável, indenominável, fora do tempo. E, nestas reuniões, estivemos investigando o que é que nos impede de alcançar aquele estado, de maneira natural, fácil, “graciosa”. Ele não pode ser “chamado”, porque uma mente medíocre não pode chamar a si a imensidade. Toda mediocridade deve acabar, e existirá então “o outro estado”. A mente não pode imaginar aquele estado de imensidade. De sua mediocridade, sua superficialidade, poderá ela “projetar” algo que pensa ser belo; mas o que “projeta” é apenas uma parte de sua própria fealdade. A estrutura psicológica da sociedade é o que somos. Ao compreendermos essa estrutura e dela ficarmos livres, então “o desconhecido”, aquilo onde não existe tempo, nem progresso, se torna existente.
PERGUNTA: Como pode uma mente condicionada compreender o verdadeiro?
KRISHNAMURTI: Não pode. Consideremos isso com toda a simplicidade. Suponhamos que eu seja nacionalista, apegado à minha pátria, a meu soberano, enredado em minha insignificante identificação com determinada raça. Como pode tal mente compreender um estado que transcende tudo isso? Não pode. Por conseguinte, a mente tem de compreender seu próprio nacionalismo, quebrá-lo, destruí-lo, repudiá-lo totalmente; e isso, em geral, nos é dificílimo. O nacionalismo é apenas uma expansão de nosso pequenino “ego”. Identificais-vos com vosso país porque sois pequeno e o país é grande. A “entidade tribal” gosta de identificar-se com algo maior do que ela — e é isso o que todos estamos fazendo. Podeis não identificar-vos com vosso país, mas desejais devotar-vos a algum alvo ou ação de suprema significação; desejais estar identificado com uma ideia ou com Deus. Quer vos devoteis à pátria, à família, quer vos torneis monge e vos devoteis a Deus, trata-se exatamente da mesma coisa: puro condicionamento. E o quebrar desse condicionamento requer, como vimos, uma percepção objetiva, vigilância de todo movimento do pensamento; ou seja, simplesmente enfrentar o condicionamento, observá-lo.
Krishnamurti, Saanen, 12 de agosto de 1962,
O homem e seus desejos em conflito