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quinta-feira, 12 de abril de 2018

A dificuldade da atenção total


A dificuldade da atenção total

PERGUNTA: A plena atenção é tão essencial em relação às coisas agradáveis, como em relação às coisas desagradáveis e dolorosas?

KRISHNAMURTI: Vede, desejamos dar continuidade às coisas agradáveis. Volvemos com a memória às alegrias da meninice, a prazeres outrora fruídos, ou nos apegamos àquilo que no momento estamos fruindo; e desejamos pôr fim às coisas não agradáveis. Mas, quando damos nossa atenção total, damo-la tanto ao agradável como ao doloroso. O desejo de continuidade do prazer é o começo do sofrimento. Por que não deve terminar o prazer? Desejais que a dor termine, mas que continue o prazer; e o depender do prazer embota a mente, torna-a insensível, exatamente como o faz a dor. Evitar o que chamamos sofrimento e buscar o prazer — tanto uma como a outra coisa acarretam aquela peculiar desatenção da mente indolente. A mente que conheceu muitos prazeres, que busca o prazer e “vive no prazer”, é uma mente entorpecida, e também o é aquela que evita o sofrimento ou continua a sofrer. Mas, vede, compreender a atenção total não é nada fácil.

Ser atento é entrar numa sala e ver as pessoas, as dimensões da sala, a cor do tapete, os quadros na parede — tudo. Mas não podeis fazê-lo, se dizeis: “não gosto daquele quadro”, “Ali está meu amigo fulano”, “Não gosto da cor do tapete”, “As dimensões da sala não são bem proporcionadas”, etc. etc. Se vossa mente está a “tagarelar”, dividindo-se entre o “de que gosta” e o “de que não gosta”, então não estais atento.

Vede, pode-se considerar uma flor botanicamente ou não botanicamente. Se a consideramos botanicamente, ainda assim há uma certa qualidade de atenção. Mas podemos também considerar a flor diferentemente, quer dizer, “sem conhecimento”. Não interpreteis “sem conhecimento” como um estado de ignorância. Ser “sem conhecimento” é possuir a sabedoria; porque o conhecimento tem continuidade, e a sabedoria não tem. “Estar atento” implica um estado de atenção isento de fronteira, limite, linha divisória. Observamos tudo, absorvemos tudo. Mas isso não se pode fazer quando há um motivo a inspirar a vossa atenção, por mais valioso que seja esse motivo. Se dizeis: “Vou estar atento, a fim de pôr fim ao meu sofrer” — nesse caso não ficais atento.

Tentai uma vez, se o desejardes, considerar totalmente uma flor, uma árvore, um ente humano. Considerar sem conhecimento, sem pensamento — o que não significa um estado de amnésia, i.e., ter a mente “em branco”. Vereis que, ao considerardes assim uma coisa, há um extraordinário estado de atenção que não é concentração. Concentração é exclusão. A mente que está atenta pode concentrar-se sem esforço, sem exclusão. Mas a mente que adquiriu a faculdade de concentrar-se por meio de esforço, treino, disciplina — essa mente jamais poderá estar atenta.

PERGUNTA: Vê-se que a mente só pode estar verdadeiramente tranquila por uns trinta segundos. Que entendeis, pois, por “tranquilidade mental”?

KRISHNAMURTI: Em primeiro lugar, a tranquilidade da mente não é um estado para ser alcançado. A pessoa não tem de dar vários passos para chegar a ele, não pode praticar um sistema a fim de se tornar tranquila, porque essa ação disciplinar só pode tornar a mente embotada. A mente que se ajusta é mente morta. Esta é a primeira coisa que cumpre perceber. A mente que se submete seja aos ditames da sociedade, seja à opinião de um vizinho, aos dogmas da igreja ou outra qualquer estrutura autoritária, nunca pode ser sensível — mas isso não significa que podeis desobedecer ao policial. Estamos tratando de coisa muito diferente. Estamos tratando da submissão no sentido de obedecer à autoridade da tradição, de um livro, um sistema, uma crença. A mente que se submete a um padrão — e isso é uma forma de disciplina — essa mente não é tranquila, porém, apenas, insensível. Esta a primeira coisa que se precisa compreender profundamente. Atrás de nossa submissão, encontra-se o desejo de segurança psicológica. A mente que busca segurança nunca pode ser livre; e é só em liberdade, completa liberdade psicológica, que pode existir a quietude mental.

Como vemos, não há passos para dar a fim de se alcançar a mente tranquila. De mais a mais, não sabeis realmente o que é “tranquilidade da mente”. O que vos interessa é, tão só, experimentar esse estado e retê-lo; daí, dizerdes que ele não dura mais de trinta segundos. Por que durar! Vede, o importante para vós não é a coisa em si, porém o que ela vos dá. Por isso, desejais saber como alcançá-la e se ela é durável, introduzindo assim o elemento tempo: ela deve ter continuidade, durar mais de trinta segundos. O silêncio que tem continuidade não é silêncio. Se o alcançais por meio do tempo, não se trata de serenidade mental.

E temos, em seguida, a questão do “observador e coisa observada”. Se há um experimentador do silêncio, não há silêncio. No momento em que dizeis: “Encontro-me num extraordinário estado de humildade”, acabou-se a humildade. Para vós, o silêncio é um estado que vós experimentais, assim como se experimenta a fome, e desejais reter essa experiência, desejais que ela continue. Por isso, há dualidade: vós e a coisa que desejais experimentar. Se examinardes isso profundamente, descobrireis que o silêncio que tendes experimentado e desejais continue, é meramente o reconhecimento de uma coisa já acabada; portanto, já não é silêncio.

Isto é talvez um pouco complicado, e requer atenção de vossa parte. O que estou dizendo é: o silêncio não pode ser “experimentado”. “Experimentar o silêncio” é uma coisa terrível. Que sugere essa experiência? Reconhecimento da coisa que experimentastes como silêncio e que é reação de vossa memória. O pensamento reconhece o silêncio. E no momento em que o pensamento reconhece o silêncio, isso já não é silêncio; é algo pertencente ao passado, a que destes no presente o nome de “silêncio”.

Assim, para compreenderdes o que é o silêncio, deveis estar livre da submissão e da limitação, livre da autoridade, livre das experiências de ontem, que acumulastes. Porque todas as experiências que acumulastes são condicionadas e ao mesmo tempo condicionantes; elas pertencem ao passado e fortalecem o passado. Também, é necessária a terminação do pensador e do pensamento como duas entidades separadas, porque esta divisão faz surgir o conflito da dualidade. Então, se não estais a buscar o silêncio, se nenhuma experiência estais a exigir, porque compreendestes o inteiro significado da experiência — então, talvez, sem o perceberdes, o silêncio poderá vir. Só a mente “inocente” é silenciosa. Alcançado esse estado, há, então, nesse silêncio, um movimento extraordinário, sem nenhum observador a observar o movimento; há só movimento, não há experimentador e, por conseguinte, não há experimentar. O tempo se tornou inexistente.

Para a maioria de nós, isso é apenas informação e, portanto, sem valor. O que tem valor é perceber o fato de que a autoridade, de qualquer espécie que seja, é destrutiva, seja autoridade da tradição, seja a do Salvador, do Mestre ou deste orador. Nós buscamos a autoridade porque desejamos certeza, não desejamos errar, queremos fazer o que é correto, seguro, respeitável. E uma mente respeitável não é apenas uma mente “burguesa”, medíocre, mas também uma mente insensível e incapaz de estar de todo atenta. Quando há atenção completa, há virtude — não uma imitação de virtude, conforme a pratica a sociedade respeitável. A virtude é então algo novo, que se encontra todos os dias, ao virar de cada esquina. Vereis que há então um silêncio e, nesse silêncio, imensurável criação.

PERGUNTA: Se vemos as coisas como são, com atenção total, com percebimento sem escolha, que acontece em relação às várias formas de arte, principalmente aquelas que se relacionam com a palavra?

KRISHNAMURTI: A beleza é coisa construída pelo homem? A beleza é questão de capacidade ou gosto pessoal? Ou é a beleza algo que transcende o pensamento e o sentimento, algo que nada tem que ver com capacidade, inclinação, simpatia e antipatia pessoal?

E que necessidade há de expressão? Podeis expressar uma dada coisa em palavras, na forma de uma poesia; podeis expressá-la na tela ou no mármore; podeis expressá-la na cozinha, ou no segurar a mão de outra pessoa. Mas, que necessidade há de expressão? Não estou dizendo que não deveis expressar-vos. Podeis expressar uma coisa qualquer, pô-la em palavras; mas a palavra não é a coisa. O símbolo nunca é o real. Mas vós expressastes a coisa e, porque sois dotado de capacidade ou talento, essa expressão se torna significativa; tem um valor, proporciona lucro, aplausos, popularidade.

Ora, como dizia, na atenção total há uma criação que não se pode exprimir em palavras, símbolos, ideias. Ela é energia total. Eu posso ter o dom de escrever poesias; mas, como posso definir essa energia total, essa coisa extraordinária chamada criação? Se não gostais da palavra “criação”, escolhei outro nome: “Deus”, “cachorro”, qualquer nome serve. Uma pessoa sente, talvez, que existe essa coisa — um movimento de criação, uma imensidade, uma atemporalidade. Entretanto, como expressar em palavras o imensurável? E, mesmo, quando o expressamos, a expressão não é a própria coisa. Assim, que valor, que importância, que significação tem a poesia para o homem ou a mulher que compreendeu essa atenção completa? Tem essa poesia necessidade de sair de casa para contemplar obras de arte, visitar museus, assistir a concertos? Entendeis? Quem bebeu na fonte da criação, de que mais necessita?

Mas, para a maioria de nós a arte, a poesia, ou a música se tornou muito importante. Somos como os assistentes de uma partida de futebol a observar os jogadores. Poucos estão jogando, e milhares assistindo. Porém, depois de vos desembaraçardes completamente da estrutura psicológica da sociedade, que importância tem a palavra, a forma, o som, o símbolo?

Receio que estejais escutando o orador na esperança de que ele vos ponha milagrosamente naquele estado ou a ele vos conduza. Mas tal não é possível. Para isso tendes de trabalhar intensamente. Requer-se uma energia imensa para ouvir corretamente. Impõe-se toda a vossa atenção, para destruir a vossa desatenção, e não há, então, distração de espécie alguma. Não existe distração, em tempo algum, para o homem atento. Já para o homem concentrado há sempre distração.

A arte, é claro, tem seu lugar próprio; mas a coisa não acaba aí. Só quando sois capaz de ultrapassar a arte, de superar a beleza criada pelo homem, só então conhecereis diretamente aquela beleza inexprimível. E, estando presente essa beleza, nada mais necessitais buscar.

Krishnamurti, Londres, 7 de junho de 1962,
O homem e seus desejos em conflito


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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill