É possível um estado
não influenciável de ser?
não influenciável de ser?
PERGUNTA:
Embora eu reconheça sentir-me lisonjeado pela admiração e susceptível à
crítica, a minha mente continua a ser governada por essas influencias; ela é
atraída ou repelida, como a agulha da bússola em presença do magneto. Qual é o primeiro passo para sermos
realmente livres?
KRISHNAMURTI: A dificuldade está em que quereis ser
livre: não quereis, porém, compreender o problema. Sois infenso tanto à lisonja
como à crítica. Desgosta-vos o ser criticado; mas, ao mesmo tempo, se bem que
desejais ser insinuante, ser admirado, sentis desprezo por vós mesmo, por
serdes tão infantil; desejais, por isso, livrar-vos das duas coisas. E o
resultado é que ficais com três problemas, não é verdade? É o que todos nós
fazemos: quando temos um problema que não
sabemos resolver, acrescentamos-lhe outros e ficamos multiplicando problemas,
sucessivamente.
Nessas condições, qual é a nossa questão? A questão
não é a de acharmos a maneira de não sermos influenciados pela admiração nem
pela crítica, mas, sim: porque desejamos ser admirados, porque nos importamos
tanto quando somos criticados ? — Este é que é o problema, não achais? Porque
desejais admiração? Porque o ser admirado vos faz feliz, dá-vos estímulo,
faz-vos trabalhar melhor. Desejais que vos estimulem por não vos sentir seguro
em vós mesmo, e necessitais, por isso, do amparo de outros; e sois susceptível
à crítica porque ela vos revela o que sois. Tal é a razão por que estais sempre
fugindo à crítica e desejoso de admiração, de estímulo, de lisonja; assim, mais
uma vez, vos vedes envolvido na batalha do querer e do não querer. Tudo isso
indica, sem dúvida, uma pobreza interior do vosso ser, não é verdade? Não há um
sentimento profundo de confiança. Não me refiro à arrogante confiança da
experiência, que é apenas um meio de fortalecer o “eu” e, portanto, sem muita
significação. Refiro-me à confiança que resulta do compreenderdes a vós mesmo,
do perceberdes todo o significado da admiração, do estímulo, da crítica. A
compreensão de vós mesmo não depende de ninguém; ela se apresentará se
estiverdes muito vigilante, atento, encontrando-vos com o que é em cada momento
que passa e abstendo-vos de julgá-lo. O autoconhecimento proporciona uma
confiança em que o “eu” não se torna importante. Não é a confiança do “eu” que
acumulou considerável experiência, ou do “eu” que possui um grande depósito no
banco, ou do “eu” que tem um vasto cabedal de conhecimentos. Nisso não existe
confiança e, sim, só e sempre, temor. Entretanto, quando a mente começa a
tornar-se percebida de si mesma e das suas reações, quando percebe todas as suas
atividades, momento por momento, sem inclinação para a comparação ou o
julgamento, então, desse conhecimento, resulta uma confiança inteiramente livre
do “eu”. Essa mente não busca a admiração nem evita a crítica; já lhe não
importa nem uma nem outra coisa, pois a cada momento encontra libertação na
compreensão do que é.
O que é é a reação, a réplica (response), o impulso, o
desejo da mente, em qualquer momento dado; e se observardes realmente o que
é, se vos tornardes apercebidos de todo o seu conteúdo, sentireis a
presença de uma liberdade extraordinária, manifestando-se sem que a mente a
tenha procurado. Quando a mente busca a liberdade, o que está querendo é
livrar-se de alguma coisa, e isso não é liberdade nenhuma, senão, unicamente,
uma reação semelhante à revolução política, que é uma reação contra o regime
vigente. A liberdade surgida com a compreensão do que é, não representa
reação contra alguma coisa; é uma libertação criadora e, por conseguinte,
completa em si mesma. Mas a compreensão do que é exige
muito discernimento, muita tranquilidade mental. A liberdade não resulta
de nenhuma espécie de compulsão, de nenhuma atração, de nenhum desejo; pode
manifestar-se, apenas, quando a mente percebe sem julgamento, sem escolha,
de modo que a cada momento se vê a si mesma tal como é. A mente que busca
liberdade nunca a encontrará, pois procurar liberdade significa barrar, afastar
o
que é; mas, quando a mente começa a compreender o que é, sem escolha,
essa própria compreensão produz uma descarga criadora, que é liberdade. A
liberdade é ímpar, ela é a verdadeira individualidade, e nela se a bem-aventurança.
Krishnamurti em, Percepção Criadora, 20 de junho de 1953
Krishnamurti em, Percepção Criadora, 20 de junho de 1953