Pergunta: Meu desejo é estar sempre convosco. Eu o tenho
conscientemente suprimido e inconscientemente reprimido. Como aprender a
dominá-lo?
Krishnamurti: Eu penso
que isto deveria ser posto em forma de poesia. Dominar o que? O desejo de estar
em companhia de alguém? Quando tornais o vosso amor pessoal, manifesta-se a
tristeza, a dor, luta, limitação imposta a essa eternidade que é o próprio Amor.
Enquanto estiverdes separados e vos aperceberdes dessa separação, a tristeza
vos aguarda. Esta coisa que me personaliza, o “eu”, morre, e se sobre este
repousardes, haverá tristeza. Se, porém, realizardes a vida, em si, a qual se
acha corporificada em tudo, em todo o ser humano, e amardes essa vida então a
mudança de formas, a mudança de manifestações, de expressões, não vos
embaraçará em sua tristeza.
Pergunta: Dizeis que “em um momento todo o tempo se acha contido” e que
“para o homem liberto não existe tempo”. Este último enunciado, tomado em
conjunto com o primeiro, implica que é possível lançar uma ponte sobre a falta
de experiência por meio da realização intuitiva indiretamente? E como se há de
fazer isto desde que nos é dito também que “o verdadeiro valor exige experiência?”
Krishnamurti: Eu disse
que para o homem liberto não existe o tempo; porém, para o homem triste, o
tempo existe. Vós tendes em conta o futuro em busca desta realização — a ideia
de que algum dia atingireis, este dia é adiado indefinidamente em virtude da
preguiça obtusa, da tardia energia. Adiais a realização por não haver um
intenso desejo. Se, porém, tiverdes intenso desejo, não tereis mais o desejo de
postergar. Com esse intenso desejo vivereis cada experiência com a qual vos
deparardes, assimilá-la-eis e assim estareis vos libertando de vós mesmos de
toda experiência. Para viverdes nesse momento, no qual se acha incluída toda a
eternidade, (cada momento é toda a eternidade), é preciso que exista essa elevada concentração,
essa realização do ser introspectivo,
ao qual chegareis por meio da incessante resistência. Então existirá esse ser
sem esforço — não no sentido de adormecimento ou de condição estática. Vós sois. Sois o
Todo. Então, para vós, todo o momento é eternidade, pois que jamais
saireis desse momento. Não vos preocupareis com o futuro nem com o passado,
pois que nesse momento todo o tempo existe. Esforçai-vos, de vez, por viverdes nessa
concentração que exige ser impessoal, libertar-se desse esforço individual
autoconsciente para serdes bons. Este esforço é possível a todos,
simplesmente desde que exista esse desejo impulsionador por detrás dele.
Portanto, não busqueis disciplinas, não busqueis guias externos que vos forcem
a essa concentração; examinai, antes, toda a experiência, todo o pensamento. O
desejo, em seu movimento ansioso, compulsivo para frente, na busca da
felicidade, firmará em vós a disciplina da concentração a qual é pura conduta.
Pergunta: Se dominar a mim
próprio com aquilo que penso ser disciplina autoimposta, com entendimento, e
apesar disso verificar que o resultado é azedume, irreflexão, dureza, onde
reside a causa disso? Será o entendimento defeituoso?
Krishnamurti: Por “entendimento” significo eu o
entendimento do propósito da existência individual, que é o não aperceber-se da
separatividade. Enquanto vos aperceberdes da separatividade haverá azedume,
inconsideração, desmazelo, crueldade, cobiça, ciúme e inveja. Se, porém,
compreenderdes o propósito desta existência individual autoconsciente, a qual é
realizar a unidade da vida, então, esse entendimento, quando houver disciplina,
não dará lugar ao azedume, à inconsideração ou à dureza. Impondes disciplina a
vós mesmos em virtude da tristeza; e então, pelo fato de ela não resultar na
consecução ou realização sobrevém a amargura. Se, porém, vossa percepção for
todo-integrativa e não conhecer separação, não haverá azedume.
Krishnamurti em Reunião de Verão, 24 de julho de 1930