Pergunta: Muitas pessoas que têm sentido profundamente a verdade do
vosso ensino dizem ter abandonado seu trabalho ordinário para executarem
somente “o trabalho de Krishnaji”. Isto confunde a outros que igualmente, de
modo profundo, sentem que lhes agradaria executar o “trabalho de Krishnaji”,
porém não se encontram seguros do que essas palavras subentendem. Poderíeis
explicar-nos qual é esse trabalho a executar?
Krishnamurti: Sinto não vo-lo pode explicar, pois
não estais executando o meu trabalho. Se estivésseis executando o meu trabalho,
não mais serieis prisioneiros das posses, da cobiça, da crueldade, do exagero
do ser, do “eu”. Meu trabalho é o de chegar a ser essa realidade, e de oferecer a cada qual essa realidade para
ser realizada por eles próprios. Se estivésseis fazendo isto, seria este o
trabalho da Vida que executaríeis, não o meu. Nisto não existe nem
Krishnamurti, nem “tu”, nem “eu”. Pensais em executar o trabalho de
Krishnamurti por vos encontrardes inseguros. Quando vos certificardes, quando
estiverdes seguros, certos, será esse o trabalho da Vida, da vossa, da vida de
todos; e daí ficareis libertos de todo o trabalho.
O medo da inatividade é que vos
conduz à atividade e vos tornais assim prisioneiros da atividade, a qual é uma
outra forma de inatividade — de preguiça mental, de indolência que paralisa a
energia vital propulsora da emoção. Pensais que quando executais o trabalho de
outra pessoa, todas as coisas se esclarecem. Isto não é mais que uma nova forma
de ilusão. Por isso é que eu disse ao começar que tendo existido um enorme
grupo organizado em redor de uma pessoa, de mim, haveis buscado a essa pessoa
para o trabalho, para a atividade (a qual é inatividade se bem o verificardes)
para terdes orientação (que realmente não o é); e daí, o dar-se gradual
afastamento de muitos e o serem poucos os que permanecem. É natural; eu não me
sinto deprimido nem lisonjeado, nem triste, nem animado. Esses poucos, uma vez
que hajam realizado — por meio do esforço contínuo, por meio do entendimento,
por meio desse recolhimento de todo o instante do dia — conhecerão aquilo de que falo. Pelo fato de estarem desejosos de
encontrar essa realidade, por terem colocado de lado todas as irrealidades, não
mais se encontram nas garras da ilusão; buscam essa certeza e não são levados a
se desviarem pelas incertezas, pelas dúvidas, pelas coisas não-essenciais da vida.
Jiddu Krishnamurti em 1 de janeiro de 1930