Pergunta: Tem-se dito que o mundo deveria ser encaminhado pelo desejo,
não pelas crenças. Portanto, não tem importância o perguntar quais são as nossas
crenças. Não sufocam as crenças o desejo e não nos deveria antes ser permitido
agir licenciosamente, dado ser isto necessário para o crescimento?
Krishnamurti: É
necessário proceder licenciosamente?
Pessoalmente, sustento eu que o
desejo é muito mais importante do que as crenças. É quando sufocais os desejos
que as crenças são criadas e a estagnação surge. É pelo constante re-despertar
do desejo que vos tornais capazes de criar, que sois capazes de progredir — uso
da palavra no sentido vulgar. Portanto, necessitais de ter desejos. A ideia de
que o Nirvana ou o Céu é um lugar onde o desejo em absoluto não existe, é
absurda. Eu sustento que a mais elevada felicidade é a do preenchimento de todos
os desejos — o ultrapassar todos os desejos pelo fato de havê-los experimentado
a todos. Os desejos são semelhantes aos feixes de lenha que adicionais a uma
figueira. Quanto mais feixes, maior a intensidade e a pureza da chama. Porém,
os desejos levam à licenciosidade, e haverá o caos enquanto cada qual não
houver fixado sua meta e não se servir do desejo inteligentemente. O selvagem possui inúmeros desejos que,
frequentemente, o tornam licencioso. Porém, o homem inteligente é aquele que já
fixou a sua meta — a qual sustento eu
ser a libertação e a felicidade — e utilização de todos os desejos para o
conduzirem a esse fim. Então existe nele a ordem. Mesmo que ele tenha grandes
desejos, não haverá caos. Esta meta é eternamente a mesma para todos, porém se
cada qual fixara meta por si mesmo, e se ela não for fixada por outrem, haverá
harmonia. As
pessoas podem correr vindo de pontos diversos, porém todas se estão dirigindo
para o mesmo centro.
Krishnamurti, 1930