Pergunta: Disseste outro dia que Deus é criado pelo medo humano.
Quereis dizer que não existe Deus, o Criador? Sinto, todas as vezes que
mencionais a Deus; pois Deus é vida, é o Bem Amado. Ou será que simplesmente
desejais destruir ideias antigas e estreitas associadas a esta concepção?
Krishnamurti: Para mim não existe coisa que se pareça com um
Deus pessoal, que estabelece um plano para que o sigais. Para mim não existe
tal plano na vida. Porém, para o indivíduo, por parte de qualquer super-homem,
de um Deus qualquer. Nas mentes da maioria das pessoas acha-se estabelecido este
Deus pessoal. Cultuam a este o Indivíduo objetivado, que mais não é que um
outro “eu sou”. Para mim, a vida é a criadora de todas as coisas, de todos os
deuses, de todos os homens; e esta vida existe em todas as coisas e o propósito
do homem é o de realizar esta pura vida,
desembaraçar-se do que é sub-humano e em que existe a consciência da separação.
Quando encarais a vida por esta
forma, cultuais a todas as coisas, não às pessoas, não ao que é externo, aos
seres objetivados; amais, adorais, cultuais todas as coisas e daí brota a reta
atitude e a reta percepção, a reta conduta para com todas as coisas. Se
olhardes para os vossos corações e as vossas mentes, haveis de verificar com
que respeito, com que adoração, tratais aqueles a quem considerais mais
evoluídos e com que vaidade, com que escarnio tratais aqueles que vos são
iguais ou que estão abaixo de vós. Que valor tem o cultuardes a um outro “eu sou”
que está acima de vós se não demonstrardes amor nem respeito algum para com o
outro “eu sou” que vos está abaixo? Se tratais a vida como sendo o todo da
criação — criação não é senão vida em movimento — não haverá divisões entre homem
e homem, nem a multiplicação das igrejas; haverá, porém, a adoração da vida em
todas as coisas e esta produzirá e firmará a realização da totalidade da vida e
não o culto a um indivíduo, a um Deus pessoal.
Krishnamurti em Acampamento da estrela de Ommen, 2 de agosto de 1930
Krishnamurti em Acampamento da estrela de Ommen, 2 de agosto de 1930