Certa vez — que é o modo pelo
qual todas as verdadeiras historias começam — havia um mundo no qual toda a
gente era doente e triste e, no entanto, todos buscavam libertar-se de seu
sofrimento e encontrar a felicidade. Em busca dessa felicidade eles oravam,
cultuavam, amavam, odiavam, casavam-se e promoviam guerras. Geravam filhos tão desgraçados quanto eles próprios e apesar disso ensinavam a
esses filhos que a felicidade era seu direito e sua meta futura.
Um dia, então, em meio deste
mundo sofredor, elevou-se um sussurro que se tornou em clamor, de que um Grande
Instrutor estava para vir, o qual, em virtude do seu amor pelo mundo e pela
sociedade, traria àqueles que se encontravam sofrendo, conforto em sua tristeza
e mostraria a todos como poderiam encontrar a felicidade perdurável que todos
andavam buscando.
E, afim de espalhar amplamente as
alegres novas da vinda do Instrutor, instituições e sociedades se formaram e
homens e mulheres foram pelo mundo falando acerca do Instrutor que deveria vir.
Alguns imploravam-no por meio de orações para que viesse mais depressa. Outros
executavam cerimônias para preparar o mundo para recebê-lo. Outros fizeram estudos
profundos de tempos esquecidos, de quando outros Instrutores haviam vindo e
ensinado, afim de, por meio desse estudo, poderem entende-lo. Alguns
adiantadamente proclamaram-se discípulos seus, afim de que, quando ele viesse,
houvesse pelo menos alguns para rodearem-no e entenderem-no.
Depois, um dia, ele veio. E disse
à população do mundo que havia vindo para trazer-lhe felicidade, para curar-lhe
as dores e suavizar as tristezas. Disse que, por meio de muito sofrimento e dor, havia ele encontrado seu caminho para uma
morada de paz, para um Reino de eterna Alegria. Disse-lhes que tinha vindo para
dirigi-los e para guia-los para essa mesma morada. Porém, disse ele que, pelo
fato de o caminho que conduzia a esse Reino ser áspero e estreito, somente poderiam segui-lo aqueles que quisessem deixar de lado tudo quanto
houvessem acumulado no passado. Solicitou-os a que deixassem de lado seus
livros, seu conhecimento, suas famílias e seus amigos. E que, se fizessem isto,
ele os proveria de alimento para a jornada, satisfaria sua ardente sede com a
água viva que possuía, e os levaria para dentro do Reino da Felicidade onde ele
próprio eternamente mora.
Então, essas pessoas que por
tantos anos se haviam estado preparando para o Instrutor, começaram a sentir-se
desconfortadas e perturbadas. Pois
disseram elas: “Este não é o ensino que esperávamos e para o qual nos estivemos
preparando. Como podemos renunciar a todo este conhecimento que tão penosamente
adquirirmos? Sem ele jamais o mundo teria entendido o Instrutor. Como
renunciarmos a todos estes esplêndidos ritos e cerimônias em cujo cumprimento
encontramos tanta força e felicidade? Como renunciarmos a nossas famílias e
amigos quando tanto deles necessitamos?
Que ensinamento é este?”
E começara a perguntar a si mesmos:
“Será este, na verdade, o Instrutor a quem estivemos esperando? Nunca
imaginamos que ele viesse falar deste modo e nos solicitasse tais renuncias”. E
aqueles, mesmo, que se haviam proclamado seus discípulos, por via de seu mais
íntimo conhecimento da sua vontade, sentiram-se desconfortados e perturbados.
Em seguida, após muito pensar e
meditação, a lua veio até eles e com ela a solução de suas dificuldades. E eles
disseram: “É verdade que o Instrutor vem para ajudar o mundo, porém nós conhecemos
o mundo melhor do que ele e, portanto, atuaremos como seus interpretes para o
mundo.”
E assim, aqueles que possuíam o
conhecimento disseram: “O seu apelo pela renúncia não se aplica a nós, pois que
o mundo necessita do nosso conhecimento e não pode passar sem ele, portanto,
por amor ao mundo, continuaremos a buscar pelo conhecimento”.
E aqueles que executavam ritos e
cerimônias disseram: “Naturalmente, renunciamos a todos os ritos e cerimônias
para nosso benefício, ultrapassamos a necessidade delas, porém, por amor ao
mundo, continuaremos a executá-las, pois de outra maneira o mundo sofrerá”. E
assim, continuaram a construir igrejas e templos a executar ritos, todos eles
para ajudar o mundo, e estiveram demasiado ocupados para darem ouvidos ao
Instrutor.
As únicas pessoas que
voluntariamente renunciaram foram aquelas que abandonaram os seus lares e
famílias por quererem se libertar dos deveres e obrigações que lhes competiam.
E vieram ao Instrutor e disseram: “Tudo deixamos para seguir-vos, buscai-nos
agora uma tarefa fácil em que possamos trabalhar para vós e também ganhar a
vida”.
Alguns, houve, poucos, que
deixaram de lado todas as coisas e, sentados ao pé do Instrutor, se esforçaram
para aprender dele o como alimentar os famintos e satisfazer os sedentos. Essas
pessoas ajuizaram que a sabedoria dele, provavelmente seria mais útil ao mundo
do que o seu conhecimento; que a sua simplicidade
seria melhor entendida do que as suas complicações;
que o Instrutor poderia estar melhor informado do que eles ao dizer que ritos e
cerimônias não eram necessários para encontrar a felicidade que ele vinha
proporcionar; que poderiam renunciar suas famílias e amigos, em seu coração, sem deles se apartarem na carne.
Os outros, reprovaram-nos pelo
seu egoísmo e preguiça. Disseram: “O mundo não precisa do pão do Instrutor,
porém, sim, de uma especial qualidade de pastelaria da qual nós temos a
receita. Ele não necessita de água que extingue a sede, porém sim do vinho
contido em nossos cálices. As palavras do vosso Instrutor não auxiliarão o
mundo, por serem demasiado simples e o mundo não pode entender o que elas
significam. Nós temos teorias complicadas para solver os complicados problemas
do mundo e o mundo pode entende-las”.
Assim, poucos houve, dentre
aqueles que mais ardentemente haviam anunciado a vinda do Instrutor, que dessem
ouvidos ao ensino que ele trouxe. Alguns disseram: “Não é este o Instrutor que
estivemos esperando, e, assim, continuaremos a prepara-nos para a vinda do
Instrutor real”. E outros edificaram muros e barreiras em redor dele, afim de
que ninguém dele se aproximasse a não ser que eles próprios abrissem as portas.
Assim, dentro em poucos anos, ele
foi-se embora e, então, essas mesmas pessoas o saudaram como um inspirado
divino e edificaram novas igrejas em seu nome e inventaram novos e trabalhosos
ritos e cerimônias para sua glória, e construíram uma nova religião sobre os
ensinos que ele não dera. E o mundo
continuou a sofrer e a clamar por auxílio.
Boletim Internacional da Estrela, nº 4, dezembro de 1929