Pergunta: Falais da estabilidade da razão e do amor como sendo a
essência da consumação. Não será antes um equilíbrio entre todas as qualidades,
e seu perfeito desenvolvimento, antes do que somente essas duas coisas citadas?
E se assim for, não devemos nós resolver todas as idades e tempos e desenvolver
essas qualidades mediante certos estágios?
Krishnamurti: Todas as
qualidades se acham contidas no pensamento e no amor.
Pergunta: Que dizer acerca da força?
Krishnamurti: Também ela
se acha contida no pensamento, se claramente o tomardes em consideração. A
força é somente o desejo de dominar e o domínio acha-se no pensamento. A paz é
a resultante do amor, do desejo de estar em harmonia com todos. As qualidades são
somente as várias ramificações de uma árvore única e, quando as raízes da
árvore forem saudáveis, então os ramos serão sãos também. Conheço muitas
pessoas que se esforçam por desenvolver qualidades especiais. Elas são fortes
nessas qualidades, mas sua própria especialização as torna unilaterais. Por
outro lado, o desenvolvimento livre e flexível do pensamento e do amor,
acompanhando a vida mediante as suas ramificações, produz o equilíbrio que é a
sabedoria — sabedoria que inclui todas as espécies possíveis de reto
pensamento; pois que é PURA VIDA,
portanto toda-integrativa. O ser realmente amorável requer grande inteligência.
Tendes que exercer vigilância, constante apercebimento e segurança de vós
mesmos.
Pergunta: O desejo de auxiliar a outros que se achem em dificuldade
está no fundo de todo coração humano. Alguns o fazem individualmente, outros
por meio de instituições. O desejo tornado instituição contribuirá por essa
forma para embaraçar o atingimento individual?
Krishnamurti: A questão
de instituição é muito simples. Podeis possuir organizações para vos proverem
do alimento que consumis; somente, porém, o fato de comerdes é que vos pode dar
força e nutrição. Esforçai-vos por distinguir entre a organização objetivo e a
subjetiva. Naturalmente tem que haver organizações no mundo objetivo dos
fenômenos, porém, não no mundo subjetivo ao qual pertenceis.
Pergunta: Ensinais que preces, ritos, cerimônias, são desnecessárias.
Isto conforme o entendo é um ensinamento para os vivos; que conselho, porém, me
daríeis acerca dos ritos e cerimônias pelos mortos? Serão tais ritos e cerimônias
necessários e essenciais? Se não forem essenciais, qual a razão de o não serem?
Krishnamurti: Se as
cerimônias são desnecessárias para os vivos, são desnecessárias também para os
mortos. Eu sustento que as cerimônias são inúteis para o crescimento humano —
cerimônias sejam de que espécie forem. O tempo para o homem que verdadeiramente
vive, não
existe. Para o homem que se apercebe da eternidade no presente, não
há vivos nem mortos. Se a todo o momento viverdes no futuro, não estiverdes
concentrados no presente, haverá morte e culto aos mortos. Muitas pessoas, eu
sei, preocupam-se com o que acontece após a morte. Para, porém, vencerdes a
morte, tendes que viver no presente. Isto não e um mero truísmo; é um fato, uma
realidade concreta para aquele que a experimenta. Será teoria somente para o
homem que continuamente olhar para o futuro buscando a solução do presente.
Pergunta: Dizeis: “Eu sou o todo” e repetis a seguir que não sois um
oráculo para resolver todos os problemas. Se sois o todo, deveis possuir a
capacidade para resolver todos os problemas. Se sois o todo, compreendo, então,
que sois onipresente, onisciente, onipotente. Por favor, explicai isto
plenamente. Estou certo que outros terão formulado a mesma ideia.
Krishnamurti: O realizar o
eu que se acha em todas as coisas [e, em um sentido, ser onipresente e
onisciente. Mas o fato de haver eu resolvido os meus problemas pessoais e me
haver tornado uno com o EU não significa que possa, por consequência, resolver
os vossos problemas. Os problemas de um homem podem somente ser resolvidos partindo para o
interior, mediante o crescer do entendimento. Mais uma vez estais à
procura de um depósito de drogas. Tendes medo; quereis ser salvos. Minha
função, se é que alguma tenho, é fazer-vos verificar que estais criando ilusões
e, portanto, estimular-vos no sentido de acabar com elas. A partir do momento
que sejais conscientes de vossas ilusões, cessareis de cria-las. Esta é a espécie
do auxílio que me estou esforçando para vos dar, e é, no fim de tudo, o que
todos poderiam fazer. Mas é difícil e sois vós que criais as dificuldades. Não haveis sofrido
o bastante para sentir o descontentamento real. Estais contentes com
vossos pequenos deuses, vossas pequenas vidas, vossas pequenas cerimônias e
vossas autoridades. Vós vos atemorizais de sair do caminho já trilhado e pesquisar.
Antes quereríeis deixar-vos de parte, seguros no que respeita às vossas ilusões
e proclamando serem elas o conhecimento. É pelo fato de não conhecerdes o que é
Real, que estas ilusões são realidades para vós.
Krishnamurti
em Acampamento de Ojai, 1930