Pergunta: Ensinai-nos a dar entrada à dúvida, porém poderemos finalizar
por duvidar tanto de tudo que nada reste?
Krishnamurti: nada
restará para aqueles que tudo aceitam por autoridade, que estão soterrados sob
a poeira da tradição, sob a poeira das crenças decadentes. Porém, pelo convite
à dúvida e, mediante ela, pela limpeza da poeira, permanece o resíduo de vossa
própria experiência, a pureza de vosso próprio propósito, o êxtase de vosso
próprio pensamento e sentimento; e a estes, ninguém pode destruir. Quanto mais
duvidardes, quanto mais examinardes todas as vossas crenças — impiedosa e logicamente
— até ao fim, mais nítida a verdade vos aparecerá em sua original força e
beleza. Porém, aqueles que temem a dúvida, serão anestesiados na poeira das
suas próprias tradições. A dúvida é um bálsamo precioso; cura, embora queimando
grandemente. Se vos atemorizais de pequenas queimaduras, jamais destruireis as
escórias, as impurezas que haveis acumulado através de vossas vidas.
Dizeis, “se duvidarmos de todas
as coisas, nada nos ficará”. Muito
melhor. Que importância tem aquilo a que vos apegais se a dúvida o pode
destruir? Que valor possuem vossas tradições, vossas crenças e o que houverdes
acumulado, se a tempestade da dúvida foz capaz de o varrer? Serão semelhantes a
um edifício construído sobre as areias: a onda forte virá e é completamente
destruído. No evitar a vida, no temer a vida, abrigai-vos nas coisas
decadentes, e, nesse abrigo, há a tristeza; porém, no convidar a dúvida e a
tristeza com plenitude de vosso coração , criareis aquilo que será eterno e
trará o selo da felicidade. Não estou usando palavras sem significado. Eu fiz
convite à dúvida, interroguei todas as coisas que diante de mim eram colocadas,
jamais aceitando fosse o que fosse, jamais permanecendo no mero estágio da concordância
e por isso encontrei, atingi. Por isso é que eu incentivo a todos que procuram
a verdade, a abrirem a si mesmos às tempestades do mundo e, a por meio delas,
destruir a fraqueza de sua mente e coração. O homem que se atemoriza com a
dúvida jamais encontrará a verdade. O homem que se atemoriza com a dúvida
jamais a convidará e, portanto, jamais sairá para os espaços abertos onde
existe a liberdade e a certeza do conhecimento.
Krishnamurti em, Perguntas e Respostas, 1928