Pergunta: mencionastes o processo do pensamento pelo qual nós criamos
nossas próprias circunstâncias. Podereis falar-nos sobre isto?
Krishnamurti: Acabo
justamente de falar sobre isto. Para usar novamente da mesma comparação, se
sois simplesmente um dente da engrenagem da máquina, sereis colhidos pelas
circunstâncias da sociedade, pelo cerco criado por outros. Mas, se por
pensamento de todo o dia, por consideração, por observação, atravessardes e
romperdes essas limitações, estareis, então, criando vossas próprias
circunstâncias, vossas próprias cercas, das quais sois mestres, e que não serão
nunca uma limitação ou um peso para vós. Por um processo mecânico ou sistema de
pensamento, nunca podereis vos libertar, e a libertação, para mim, é a riqueza,
a plenitude de si própria que é harmoniosa. A tal chegaremos, não como escravos
da cerca, mas se a vencermos. Necessitais da coragem de vossas convicções. Não
importa quais sejam as consequências; se pensardes que determinada coisa está
certa devereis executa-la diariamente. É esta a razão por que um pecador é
sumamente superior a um homem que receia sua ação, que está sempre em
estagnação, que é a mediocridade. Não estou falando com severidade; estou
falando dos fatos. Um homem que não pode se afastar do caminho, que não é
experimentado, que não luta, não será nunca feliz.
Pergunta: Há quem ache falta de interesse em livros de qualquer
espécie, em dramas e cinemas, por não darem expressão da realidade ou da
criação individual. Deve-se acreditar nisto?
Krishnamurti: Não sei
como se possa acreditar nisto. Se vos excluirdes de todas essas coisas, estareis
bloqueando canais de interesse e deveis ser interessado por todas as coisas que
acontecem em torno de vós. Não deveis ficar longe do progresso do homem, quer
material, quer espiritual. Deveis estar em contato com ele, porque precisais
ajudar o homem a ir além de todos os limites. Não sejais como o asceta que se
afasta do mundo, por acha-lo terrível. Antes, sede como a árvore que tem raízes
profundas nas entranhas escuras da terra, enquanto os galhos de cima se agitam
no espaço.
Para caminhardes a grande
distância, deveis principiar perto; para subirdes alto, devereis começar por
baixo. O grande perigo de pertencerdes a qualquer sociedade está em retira-vos
gradualmente, por um processo inconsciente, das coisas exteriores, e em vós
excluirdes a vós mesmos, pelo desejo de serdes diferentes dos demais e, portanto,
em obstruir canais somente através dos quais a vida pode funcionar livremente.
Krishnamurti em Reunião de Inverno em Adyar, 29 de
dezembro de 1929