Rompendo os limites do
mecanismo social
Pergunta: A
delinquência juvenil tem crescido, neste pais, em proporções alarmantes. Como
pode ser resolvido este problema, que se vai tornando cada vez mais grave?
KRISHNAMURTI: É óbvio que tem de haver revoltas
dentro do padrão da sociedade. Certas revoltas são respeitáveis, outras não o
são, mas todas elas estão circunscritas na esfera da sociedade, dentro, dos limites
da “cerca” social. E, certamente, numa sociedade baseada na inveja, na ambição,
na guerra, são de esperar revoltas dentro dela própria. No cinema, vê-se muita
violência. Tivemos duas tremendas guerras totais, representando a violência
total. Toda nação que mantém um exército tem de ser destrutiva dos seus
próprios cidadãos. Por favor, prestai atenção a isto. Nenhuma nação é pacífica,
enquanto tem um exército defensivo ou ofensivo. Todo exército é ao mesmo tempo
defensivo e ofensivo, e nunca criará um Estado pacífico. No momento em que uma
nação institui e mantém um exército, está destruindo a si própria. Isto é um
fato, historicamente comprovado. E, de todos os lados, vemo-nos estimulados à
competição, à ambição, ao sucesso. A competição, a ambição e o sucesso são os
deuses de uma sociedade excepcionalmente próspera, como esta, e que se pode
esperar daí? Desejais que os delinquentes juvenis se tornem cidadãos
respeitáveis, e só isso. Não atacais as raízes do problema, o que significa
deter completamente o “mecanismo” da guerra, da manutenção de exércitos, da
ambição, do estímulo à competição. Estas coisas, que se acham arraigadas em
nossos corações, são as “cercas” da sociedade, dentro das quais está sempre
havendo revolta, tanto da parte dos jovens como da parte dos velhos. O problema
não é só a delinquência juvenil; ele envolve toda a nossa estrutura social e
não terá solução enquanto vós e eu não nos retirarmos para fora da sociedade —
da sociedade, que representa ambição, crueldade, desejo de sucesso, de nos
tornarmos pessoas importantes, de galgarmos os postos mais altos. Todo esse
processo é, essencialmente, o egocêntrico esforço de preenchimento e a
diferença é só que nós o tornamos “respeitável”. Como incensais o homem bem
sucedido na vida! E como enalteceis e condecorais aquele que mata milhares de
homens! E há também as divisões criadas pela crença, pelo dogma — o cristão e o
hinduísta, o budista e o muçulmano. São estas as coisas que estão produzindo
conflito; e quando procurais resolver o problema da delinquência juvenil,
obrigando os jovens a ficarem em casa, ou disciplinando-os, ou alistando-os no
exército, ou recorrendo às várias soluções oferecidas pelos psicólogos e
reformadores sociais, estais, por certo, atendendo de maneira muito superficial
a uma questão fundamental. Mas nós temos medo de atacar as questões
fundamentais, porque nos arriscaríamos a tornar-nos impopulares, a ser chamados
comunistas, ou sabe Deus o que mais — e os rótulos parecem ter para nós uma
importância extraordinária. Seja na Rússia, seja na Índia, seja aqui mesmo, o
problema é essencialmente o mesmo, e só
quando a mente compreender toda esta estrutura social, poderemos encontrar
um modo completamente diferente de atender ao problema, estabelecendo, assim,
talvez, a verdadeira paz, e não a espúria paz dos políticos.
Krishnamurti, 7 de agosto de 1955
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