Pergunta: Para muitas pessoas, lutar é mais interessante do que
atingir. Na concepção de uma meta final a ser atingida por todos, e parece
haver um sentimento de finalidade e compleição que importa em estagnação. Será
isto uma concepção errada?
Krishnamurti:
Inteiramente. A meta da vida é o começo e o fim; não existe, porém, fim. Se o
lutar é mais interessante que o atingir é porque não estais grandemente
interessados. Vosso semblante, vossa atitude, vossas obras não evidenciam o
frêmito da vida. Pelo fato de não estardes lutando é que existe a estagnação e
não por causa da consecução, que mais não é que uma maneira suave de a vós
mesmos enganardes. A ideia de que a vida chega a um fim é absurda. Um rio que
penetra no mar não chega ao fim; une-se a maiores águas. Assim também é a vida
que atinge o oceano de toda a vida onde não existe limitação.
Pergunta: Dizeis que a meta deve ser o guia para a vida e que essa meta
é a perfeição. É possível alcançar essa perfeição em uma só vida? Muitas
pessoas não aceitam a ideia de qualquer consciência continuando após a morte, e
não observam como o atingimento da perfeição seja para eles possível em uma só
vida.
Krishnamurti: Por outras
palavras. É necessário acreditar na reencarnação? Este é o pensamento que se
encontra por detrás dessa pergunta. Como não se pode atingir a verdade, que é
perfeição, em uma só vida, precisa-se de acreditar que exista consciência após
a morte e que a consciência volte à terra na forma, que é o que denominamos
reencarnação.
A reencarnação não deve ser
tomada como um dogma, uma crença em virtude da qual o povo entre em contendas.
É apenas uma ponte para a compreensão. No fim das contas, o que tem importância
é que certa vida condicionada — a verdade que é vida, a princípio encontra-se
condicionada — tem de aperfeiçoar-se mediante a libertação das coisas. É este o
atingir do preenchimento da vida, e eu sustento que ele é possível para quem
for sábio, para o homem que estiver possuído do ardente desejo de obter isto em
uma só vida. Uma vez mais vos digo, que não façais disto um dogma ou uma
crença. Pode talvez dar-se que tal coisa exija muitas vidas sucessivas para ser
atingida, podendo chamar a isto reencarnação, ou continuação da consciência.
Tal coisa não é de grandíssima importância. O que é de grande importância é aperfeiçoar e
libertar esta vida que está dentro de vós, agora, e não em
qualquer tempo de futuro. De que vale o virdes a ser muito poderosos num
futuro distante? Isto será apenas uma esperança seduzindo-vos, em vossa frente.
O passado não tem valor por estar
passado; o presente é a resultante do passado, e desde que podeis dominar o
futuro, o presente é que é de máxima importância. Como vos é dado o poder de
dominar, utilizar o futuro para o fazerdes servir aos vossos propósitos, o
tempo, como tal, cessa de existir se trouxerdes esse futuro para o presente. Se
o futuro puder ser controlado, dominado pelo presente, o presentes será eterno;
o presente é a verdade, isso, porém, não significa que a sombra do presente
deva empolgar-vos por tal maneira que percais de vista o eterno, na distância
que denominais o futuro.
Pelo aperfeiçoamento do presente,
pelo constante observar e dominar de
cada segundo do presente é como encontrais a verdade e abris a porta para
esse reino da felicidade, para essa eternidade que é a verdade, para esse
preenchimento da vida que é o começo e o fim. Se encarardes isto sob um ponto
de vista, assim, todos os sistemas, todas as crenças, todos os dogmas, todos os
gurus serão de mínima importância,
serão como as nuvens que passam, arrastadas pelo vento. Assim como a abelha
junta mel tirando-o de cada flor afim de armazená-lo para o inverno, utilizai
vós outros o momento presente para servir o vosso crescimento e para melhor entender
e auxiliar a outrem.
Krishnamurti, 1930