Pergunta: Como sugerireis a maneira de levar a felicidade até o reino
animal?
Krishnamurti: Tornando-vos
vós próprios felizes. Não me entendais mal, nem penseis que enquanto tal não
acontece, deveis ser cruéis para com os animais.
“Como sugerireis levar-lhes
felicidade?” resposta: Não sendo cruéis. Vós sois cruéis para com o vosso
próximo. Se não resolverdes vosso próprio problema; se não existir paz e
certeza, se não houver serenidade em vossa mente e coração, não podereis dá-las
aos outros. Se não possuirdes a força grandiosa da montanha ou a profundeza do
lago das serras, não podereis dar dessa força, desse entendimento aos outros.
Portanto, o problema individual é o
problema do mundo. Não é por executardes certas coisas externas que
atingireis isto.
Pergunta: Pode o Reino da Felicidade ser um estado coletivo?
Krishnamurti: tendes medo
de vos perder a vós próprios.
Tomai o exemplo de um rio. Esse
rio possui individualidade durante o tempo em que está limitado pelas margens;
a partir, porém, do momento em que penetra o oceano, perde a sua
individualidade.
Do mesmo modo, o homem, quando
limitado, quando separado, busca necessariamente a coletividade.
No atingir, porém, o reino da
Felicidade, não existe coletividade, porque vós sois tudo e tudo está em vós.
Pergunta: Qual o processo de estabelecermos nossa meta, que é
felicidade? O que é a felicidade como coisa distinta daquilo que é buscado por
todos e que se denomina prazer?
Krishnamurti: Se
quiserdes passar pelos exames da B.A. ou da M.A, tomais isto como sendo a vossa
meta até que tenhais passado. Da mesma forma, se desejardes ser felizes, não
existe outro processo de estabelecer vossa meta, outro que não o de deixar de
lado aquelas coisas que criam desentendimento entre vós e a vossa finalidade.
Podeis chamar ao próprio desejo de felicidade, um processo.
O que todos procuram é a
felicidade. Pode a princípio ser como um mero prazer. Precisais provar todas as
coisas para descobrirdes o que é real, o que é perdurável e fundamental. Vós
próprios é que tendes de distinguir entre aquilo que é essencial e o que não o
é. Nenhuma outra pessoa vos pode prestar informações a este respeito. Se eu vos
disser que isto é essencial, e que aquilo não é essencial, isso se tornará apenas
numa gaiola.
Pergunta: Poderia parecer que a felicidade individual fosse
possivelmente obtida a expensas de outrem, ou apartado de outrem. Onde é que a
felicidade individual e a felicidade coletiva se encontram?
Krishnamurti: Não existe
coisa que se pareça a felicidade individual e felicidade coletiva. Se um
indivíduo estiver abrindo caminho através de uma floresta escura, significará
isto que ele esteja utilizando esse caminho para si próprio e que outros dele
não se virão a servir? Se um indivíduo perceber qual é a meta última — que não
tem começo nem fim — para o mundo, se verificar sua existência e por esse
motivo a atingir, significará isto que ele esteja abandonando seus amigos ou
servindo-se deles como de degraus para avançar? Amigo, estais imbuindo da ideia
de que tal felicidade seja egoísmo. Se fosse egoísmo, não seria felicidade;
seria uma coisa estupidificante. Egoísmo e desinteresse, tristeza e alegria,
bem e mal são reversos de uma só medalha. São semelhantes à luz e à sombra.
Para se poder entender a luz, é preciso passar pelas trevas, e para compreender
as trevas é preciso passar pela luz. Agora, podeis dar-lhes o nome que vos agradar.
O atingimento individual é o
caminho único para o entendimento da verdade. Coletivamente não pode ela ser
entendida, pois que cada qual a interpretará diferentemente, de acordo com seu
ponto de vista, até que finalmente alcance essa meta onde existe a eterna
unidade. Não existe convergência entre a coletividade e o indivíduo. Que é que
constitui a coletividade? — Vós e eu. Se nessa massa as unidades separadas, os
indivíduos, não forem felizes, a massa também é infeliz. Enquanto o indivíduo
não houver estabelecido ordem dentro de
si próprio, não houver encontrado a
serenidade e a tranquilidade que resultam da visão da finalidade eterna, criará ele
desordem, a desgraça, o desentendimento e a confusão, tais como as que vós
todos criais nos tempos presentes, a ordem temporária não é de importância; ao
contrário disso, o que necessitais de estabelecer é a ordem que perdura, pelo
fato de a haverdes fundado sobre aquilo que é eterno.
Krishnamurti, 1930